sábado, 9 de outubro de 2021

AS ESTRELAS QUE EU CONTEI Capítulo 13



 CAPÍTULO 13


Achei estranho que o sol parecia nunca se por naquele lugar, e perguntei sobre isso. Imediatamente, começou a escurecer, e lindas estrelas apareceram num céu colorido de lilás e rosa, que escureceu gradativamente. Senti vontade de voltar para casa, e disse aquilo em voz alta. Naquele instante, olhei para o lado e as duas mulheres não estavam mais lá. Mas Téo, o avô de Afonso, estava sentado ao meu lado, e disse:

-Você já vai embora, mas antes de ir, achei que gostaria de em encontrar algumas pessoas.

Ele apontou para frente, para a mesma entrada junto à floresta por onde eu tinha chegado, e eu avistei três sombras que se aproximavam devagar. Apertei os olhos para enxergar melhor, e lá estavam papai, Tia Samira e minha avó Dora. Senti como se meu coração fosse sair pela boca de tanta alegria, e me levantando da cadeira, desci as escadas da varanda correndo, ganhei a distância que nos separava e me joguei nos braços de meu pai, chorando tanto que mal podia me controlar. Deixei-me ficar nos braços dele, sentindo sua mão acariciando meus cabelos, aproveitando a certeza de ainda poder ser amada por ele. Quando o olhei, ele sorria, tranquilo. Abracei minha tia Samira também, e minha avó. Nós os sentamos no gramado, que estava fresco e perfumado. Acima de nossas cabeças, planetas giravam, estrelas cintilavam e uma lua muito branca iluminava tudo. Avistei pontos de luz nas árvores, e eu logo soube que eram minhas amigas.

Meu pai foi quem falou primeiro:

-Você cresceu tanto, Chiara, está tão linda! 

Minha avó e tia Samira permaneceram em silêncio. Respondi:

-Pai, você é feliz?

Ele demorou um pouco, mas acenou positivamente com um leve gesto da cabeça. 

-Eu seria bem mais feliz junto de vocês. Mas é a vida... 

-Vocês três... moram juntos?

Tia Samira respondeu:

-Não, nós nos encontramos aqui apenas para ver você, mas estamos em lugares diferentes. Não se preocupe, não havia nada entre seu pai e mim antes, e não há nada agora. Diga a todos que eu sinto saudades. 

Ela começou a desaparecer devagar, e  junto com ela, minha avó.

Olhei para o meu pai, e abracei-o com força, com medo de que ele também desaparecesse. Fechei os olhos e tentei imaginar que sempre estaríamos juntos, que ele jamais iria embora para longe de mim, e ele disse, como se adivinhasse meus pensamentos:

- De certa forma, jamais a deixarei, minha filha querida. Sempre que precisar de mim, basta pensar. Não poderei responder a você sempre, mas saiba que estarei sempre ouvindo, e farei o que for possível. 

A voz dele foi sumindo nas últimas palavras que ele disse. Senti que nós desaparecíamos juntos daquele lugar, como se voássemos. Ainda olhei para trás, e vi a casa se afastando. 

Comecei a me sentir levemente tonta e indisposta. Senti minha visão tornar-se turva, enquanto o rosto de meu pai, inclinado em minha direção, ia aos poucos desaparecendo. Tudo começou a girar, e eu me senti muito enjoada. Quando abri os olhos novamente, eu estava deitada junto ao tronco de árvore, no meio da floresta. Uma dor aguda fez minha cabeça latejar, e levando a mão até a parte de trás da cabeça, senti uma protuberância úmida; era sangue. Eu pensei que havia caído e batido a cabeça, desmaiando. Sentei-me devagar no solo, olhando em volta. Será que eu tinha sonhado tudo aquilo?

Ao ter aquele pensamento, senti uma presença perto de mim. Era uma fada, que sentada no tronco junto a mim, me olhava. Ela balançou a cabeça me sorrindo, e tive certeza de que tudo fora real. 

Escutei ruídos de passos e vozes  na floresta, chamando meu nome. Olhei para cima, e o sol estava alto, como se muitas horas tivessem passado. Virei para o lado e vomitei. A sensação de enjoo começou a desaparecer. Logo vi surgirem as figuras de Afonso e mamãe, aflitos. Procuravam por mim, acompanhados de dois homens que trabalhavam na fazenda. Ao me verem no chão, um dos homens gritou: “Ela está aqui!” Mamãe correu na minha direção, e me abraçou com força:

-Estávamos tão aflitos, Chiara! O que aconteceu?

-Eu... acho que eu desmaiei. Bati a  cabeça. Mas... 

Naquele  momento, vários homens e mulheres da fazenda nos rodeavam, conversando baixinho. Afonso me ajudou a me levantar, me perguntando se eu conseguiria andar, e eu disse que sim.

Logo chegamos à fazenda, e me colocaram na cama imediatamente. Tamara nos seguiu, parecendo muito preocupada. Minha irmã Sara também nos seguiu até o quarto.  Mamãe pediu:

- Tamara, por favor, traga alguma coisa para ela comer.

Protestei:

-Não precisa, já comi. 

Minha mãe me olhou:

-Como assim? Você deve estar confusa, pois  saiu de casa ainda de madrugada, e já são quase quatro da tarde. Perdeu o café e o almoço. Filha, nunca mais quero que você adentre a floresta sozinha. 

-Mãe, eu não estou com fome. Mais tarde eu como. Preciso descansar. Quero ficar sozinha. Mas antes, me deixe conversar com Afonso. A sós.

Minha mãe e Sara me olharam, confusas, mas saíram do quarto seguidas por Tamara. Afonso sentou-se na beirada da cama, pegando minha mão devagar.

-Ficamos todos tão aflitos, Chiara. Nunca mais faça isso. A mata pode ser perigosa. 

- Prometo. Mas eu preciso te dizer uma coisa importante. Não sei se minha mãe já falou de mim... sabe, eu... eu tenho sonhos e visões. 

Falei aquilo com muito medo de que Afonso pensasse que eu era uma menina louca, ou que simplesmente não acreditasse em mim, mas ele me olhou com todo respeito, sem nada dizer, disposto a me escutar. Gostei dele ainda mais. Ele me ouviu em silêncio, acenando com a cabeça, e lágrimas caíram de seus olhos muitas vezes. Mas ele nunca me interrompeu. Finalmente, quando terminei de contar tudo a ele, ele me disse:

-Eu acredito em você, Chiara. Porque na noite passada, tive um sonho com Clara, e ela me pedia para escutar a sua história. Eu não consegui parar de pensar nisso o dia todo, enquanto procurava você. Eu... jamais... nunca tinha sonhado com ela antes. O sonho foi confuso e muito rápido, mas ao mesmo tempo, muito forte. Era como se estivéssemos conversando por um telefone com muitos chiados.

Eu me sentei na cama:

-E agora, Afonso, o que vai fazer, sabendo que Rosália é tão perigosa? 

Ele respirou profundamente, baixando os olhos.

-Sinto muito por Tamara, mas... eu vou ter que chamar a polícia. Mas antes, precisamos encontrar o corpo de Clara, e reunir provas contra ela. Precisamos provar que essa história louca é verdadeira.

Eu me lembrei do que Rosália me dissera:

-As provas estão todas em um baú, debaixo da cama de Rosália. Clara me disse.

Ele ficou boquiaberto. Vou lá imediatamente.

Dizendo aquilo, ele se ergueu da cama. Quando Afonso chegou à porta, eu disse:

-Tome muito cuidado, ela é perigosa!

Ele sorriu de leve antes de fechar a porta. Depois, caí em um sono profundo e sem sonhos  que durou até o dia seguinte, quando despertei varada de fome. Levantei-me da cama e tomei uma chuveirada, me vestindo. Achei que era cedo e que todos ainda dormiam, tal o silêncio dentro da casa. Calcei meu tênis e abri a porta do quarto, me dirigindo até a cozinha, mas ao chegar lá, não encontrei as pessoas trabalhando, como sempre. Tudo estava vazio e silencioso. 

Fui até o quarto de mamãe e Afonso, e eles ainda dormiam. Chamei-os da porta, tentando acordá-los, mas eles não responderam.  Corri até o quarto de Clara, e ela também dormia profundamente. O mesmo aconteceu ao procurar por Tamara e pelas cozinheiras. Todos na casa dormiam. 

Lembrei-me de que eu tinha sido a única a não comer nada que tinha sido preparado no dia anterior, e senti um medo enorme tomar conta  de mim. Corri até o telefone, e aliviada, escutei o sinal de linha ativa. Abri o caderninho de endereços, trêmula, e localizei o telefone da polícia, que disquei. Uma voz fria me respondeu:

-Delegacia de polícia, bom dia.

Eu estava tão nervosa, que minha voz custou a sair, e a pessoa do outro lado teve que dizer “alô” duas vezes. Finalmente, minha voz saiu pela garganta, alta e histérica:

- Estou na Fazenda Santa Clara, e tem alguma coisa errada. Ninguém acorda, estão todos dormindo e não acordam!

O homem do outro lado respondeu:

- Calma, fique calma. Qual é o seu nome, menina?

-Chiara. Sou enteada de Afonso, dono da fazenda. Eles não abrem os olhos! Acho que alguém colocou remédio no jantar de ontem. Venham rápido, por favor!

Foi quando escutei um ruído de algo queimando, e pensei ser a lareira. Mas ao olhar para o meu lado direito, percebi que havia um fogo começando na cozinha. Eu podia ver o corredor longo, e a fumaça começando a se formar. Gritei ao telefone:

-Venham logo, a casa está pegando fogo!

- Já estamos a caminho. Mandei uma viatura agora mesmo. Você consegue sair da casa? Saia da casa!

-Mas não posso deixar todo mundo aqui dentro! Minha mãe, Afonso, minha irmã, as pessoas...

-Corra e busque ajuda! Levaremos pelo menos vinte minutos até conseguirmos chegar, então vá buscar ajuda!

Desliguei o telefone, e ao passar pelo corredor, vi que o fogo na cozinha estava crescendo. As cadeiras e a mesa já começavam a queimar. Tentei abrir a porta da sala, mas ela estava trancada. As janelas da sala também. A fumaça começava a se espalhar mais rapidamente. Olhei em volta, procurando alguma coisa com a qual pudesse tentar quebrar uma janela, e vi o atiçador da lareira. Peguei-o, e arremessando-o contra a vidraça com toda a minha força, consegui quebrá-la. Saí pela janela, gritando por socorro. 

Para meu alívio, alguns trabalhadores vieram em meu auxílio, e eles conseguiram tirar as pessoas de dentro da casa antes que o pior pudesse acontecer. Porém, infelizmente, não pudemos salvar a vida de Tamara. O fogo se alastrou rapidamente, destruindo toda a casa. Quando a polícia chegou com os bombeiros, não havia mais nada que pudesse ser feito. 

Tamara se tornaria mais uma estrela no céu da minha vida. 


(continua)














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