sábado, 29 de agosto de 2015

O DIÁRIO DO FIM - PARTE IV



 



Nos dias que se seguiram, tentei contato com meus filhos de todas as formas possíveis, e não consegui, nem mesmo através da embaixada. Tudo o que sabíamos, é que eles tinham deixado o apartamento com as malas e ido para o aeroporto de Lisboa há quase dez dias. Naquele dia, houve uma grande manifestação popular nas ruas que deixou cento e quinze mortos e mais de quinhentos feridos, uma verdadeira catástrofe, e eu só pensava que meus filhos poderiam estar entre eles. Quando a aflição tomava conta de nós, Sara percebia, e vinha sentar-se ao nosso lado. Seu olhar calmo e gentil parecia exercer um poder pacificador sobre nossas almas, e notei que Renan afeiçoava-se cada vez mais a ela. Várias vezes, vira os dois conversando baixinho no jardim, e naqueles momentos, eu percebia que Sara deixava de agir como uma criança e seu semblante tomava ares amadurecidos. 

Ela brincava com Pedrinho e Luisinho como se fosse uma menina crescida tomando conta de crianças menores, demonstrando muita paciência com eles, e sempre deixando-os vencer durante os jogos e brincadeiras. Genaro e Dora também já tinham reparado no ar tranquilizador da menina, e Dora às vezes comentava que Sara era como se fosse um verdadeiro anjo, tomando conta dos seus filhos. 

Certa noite, tive um sonho com meus filhos. Vi-os no chão de uma caverna, as malas abertas, sentados junto a uma fogueira, havia outros jovens com eles. Pareciam estar fisicamente bem, embora angustiados. Meu filho Ian mostrava um computador quebrado, e minha filha Bruna tentava montar as peças de um celular despedaçado. Eu os olhava como se assistisse à cena de algum plano mais alto. Via os topos de suas cabeças, e embora esticasse a mão para tocá-los e tentasse falar com eles, eu não conseguia mover-me; sentia que meu corpo era apenas um pequeno círculo que eles não conseguiam ver. 

Acordei suando muito, angustiada e com um nó na garganta. Olhei para o lado: Renan dormia profundamente, e como ele já não vinha dormindo bem há vários dias, achei melhor não importuná-lo; mas o sonho me impressionou profundamente, e não consegui mais conciliar o sono. Levantei-me, caminhando até a cozinha; mas quando passei pela sala de estar e olhei pela porta de vidro, algo branco se movendo chamou minha atenção: era Sara, que vestia uma camisola branca. Fiquei parada, observando-a. Ela estava descalça, e parecia andar pelo jardim seguindo uma direção lógica. Às vezes, erguia os bracinhos para o céu, e ficava naquela posição durante alguns segundos. Achei que ela pudesse estar tendo uma crise de sonambulismo, mas alguma coisa me fez ficar quieta, apenas observando-a.

Vi quando ela caminhou para fora do jardim, seguindo a trilha que ia dar no reservatório de água, junto à mata ressequida. Abri a porta e segui-a noite adentro. O luar estava claro, e era muito fácil enxergar. A brisa quente da noite e o esforço da caminhada logo cobriram minha testa de pequenas gotas de suor, que começaram a escorrer pelo rosto, mas ela parecia caminhar sem esforço, fresca e decidida.

Andamos durante os cinco minutos necessários para chegarmos ao reservatório, e escondi-me atrás de uma pedra para observar melhor o que ela faria. Ela chegou até o reservatório – uma caixa de cimento quadrada, com uma pesada tampa de madeira por cima. Eu não senti nenhuma apreensão, pois sabia que uma menina pequena como ela jamais seria capaz de erguer a tampa, mas boquiaberta, vi quando Sara apenas ergueu a mãozinha e empurrou a tampa sem o menor esforço. Saí de meu esconderijo, apavorada diante da possibilidade de que ela caísse lá dentro, mas antes que eu pudesse gritar ou chegar até ela, ela subiu rapidamente na beirada do reservatório e pulou na água. 

Eu queria gritar e não conseguia. Corri até a beira do reservatório, olhando lá para dentro à procura dela, mas tudo estava quieto, e a lua se refletia na água. Eu estava apavorada. Tentava falar, chamar por Sara, mas a voz não saía. Meu coração acelerado parecia bater dentro da minha cabeça. Pensei em pular também, mas eu não sabia nadar e não poderia ajuda-la. Tudo estava estranho, pois eu vira claramente quando Sarah pulara na água, mas a superfície estava calma, sem qualquer sinal de agitação. Havia mais alguma coisa estranha que eu não conseguia perceber, mas que ficava agarrada à beira de minha mente procurando um sentido. Eu olhei em volta do poço, e dentro da mata. Só havia o silêncio e o cricrilar de grilos, e alguns pirilampos que passavam. Eu teria sonhado aquilo tudo?

De repente, eu finalmente senti o que se agarrava à beira de minha mente, e que eu não estava conseguindo enxergar: o reservatório estava cheio até a boca! Respirei profundamente, levando as mãos à cabeça, e foi quando escutei o ruído da água da mina entrando com pressão. Aquilo não fazia o menor sentido, pois segundo Genaro, a mina secara há algumas semanas, e o reservatório esvaziara bastante depois que ele e sua família passaram a viver conosco naquela casa. 

Um arrepio na nuca quebrou o calor da noite. Olhei para trás, e vi Sara de pé, seca, atrás de mim. Tive medo dela. Tive medo, e vontade de sair correndo; afinal, ela não era uma criança normal. Vi quando ela levou a mão até os lábios, e soprou-me um sinal de silêncio. 

O que se passou em seguida não está claro na minha mente até hoje, e portanto, não posso explicar. Eu senti que o ar tornara-se mais frio enquanto eu voava sobre a propriedade, e então vi a janela de meu quarto. Acordei em minha cama na manhã seguinte, sentindo-me mais cansada que o normal. 

Eu queria falar com alguém a respeito da noite anterior, mas o que eu diria? Como poderia sequer começar a falar naquilo tudo? Decerto, pensariam que eu estava louca! Eu mesma me senti uma louca, quando, após vestir-me e dirigir-me para a cozinha a fim de tomar o café da manhã, encontrei todos à mesa, conversando, como se nada tivesse acontecido. Olhei para Sara, que me sorriu, dizendo o mais casual “Bom dia” do mundo. Ela ria e conversava com Pedrinho e Luisinho, planejando as brincadeiras do dia. O mundo estava um caos, e as crianças só queriam saber de brincar, e Genaro e Renan conversavam sobre banalidades como se nada estivesse acontecendo. Meus filhos estavam desaparecidos e ninguém parecia se importar. Uma criança mergulhara num enorme e profundo reservatório de água – que deveria estar pela metade, mas estava cheio até a borda – e a vida corria normalmente.

Sentei-me à mesa, a cabeça entre as mãos, sentindo que tudo era estranho, banal e não fazia o menor sentido. Até mesmo Bubo roía um pedaço de osso no canto da cozinha, despreocupadamente, alheio a tudo. Olhei para todos aqueles rostos, que nem sequer pareciam me notar. O grito que dei saiu bem lá de dentro de mim, inesperadamente; eu não queria fazer aquilo, mas quando vi, estava gritando bem alto, extravasando dias e dias de angústia e medo através da garganta. Quando parei de gritar, sentia um formigamento por todo o meu corpo, e lágrimas desciam pelo meu rosto. Todos estavam em silêncio, me olhando. Em câmera lenta, vi Renan aproximar-se de mim e acariciar meu rosto, pegando-me pela mão e levando-me de volta ao quarto. Ajudou-me a deitar na cama, sentando-se ao meu lado, acariciando minha testa. Ninguém me questionou ou perguntou o que estava acontecendo. Da cozinha, vinham murmúrios e sussurros, e vi que eram de Dora, acalmando as crianças e pedindo a elas que fossem brincar lá fora, mas sem fazer barulho.

(CONTINUA...)



quarta-feira, 26 de agosto de 2015

O DIÁRIO DO FIM - PARTE III






Acordei na manhã seguinte com as vozes e risos das crianças brincando no quintal. Era como se eles e Sara se conhecessem há muito tempo. Cheguei à janela e observei, sem ser vista, enquanto eles corriam, brincando de pega-pega. Percebei que Sara muitas vezes deixava-se pegar por Luisinho, que era mais novo e corria menos que o irmão. Eles corriam e brincavam sem a menor preocupação, e pensei no quanto crianças são sempre crianças em qualquer lugar, e em qualquer situação. Pensei também que eu gostaria de ter ainda um pequeno sentimento de otimismo que me restasse... enquanto eu os observei, ainda pude sorrir e esquecer-me de que vivíamos em uma época sombria, apesar do brilho e calor escaldante do sol. De repente, Sara ergueu os olhos e deu comigo olhando para eles. Ela parou de correr por um instante, e me sorriu.

Genaro e Renan foram até a casa de Dona Berta para ver como iam as coisas. Enquanto isso, eu e Dora ficamos preparando o almoço e cuidando da arrumação da casa. O calor forte fazia com que fosse difícil movimentar-se, varrer, ficar ao vapor do fogão da cozinha. Mesmo tendo o ventilador ligado ao máximo, a impressão que dava era que uma massa de ar quente era deslocada em nossa direção; mas se o desligávamos, era ainda pior! 

Por volta das onze horas, o termômetro da varanda marcava trinta e sete graus à sombra. Olhávamos para o céu a procura de nuvens de chuva, mas ele estava límpido, azul e tranquilo. Nenhum vento sequer para amenizar o clima extremamente quente. Eu e Dora nos sentamos à varanda para descansar – o almoço já estava pronto – e servimos suco de laranja gelado às crianças. Naquele instante, Renan e Genaro voltaram da casa de Berta. Disseram ter batido insistentemente, mas ninguém respondera, apesar de terem ouvido o cão latir. Pensavam que ela podia estar dormindo ainda, e acharam melhor voltar após o almoço. Mas o mesmo se deu: o cão latia desesperadamente, mas ninguém atendeu a porta. Genaro tomou a decisão de entrar à força, afinal, Berta já era uma mulher bastante idosa, e ele temia que algo tivesse acontecido a ela. Arrombaram a porta, chamando por ela. Logo sentiram um cheiro horrível. Seguindo os choramingos de Bubo, o cão Beagle de Berta, chegaram ao quarto e depararam com a cena que já esperavam: ela estava morta, e parecia que  há mais de três dias. 

Chamamos a polícia. Tivemos que prestar depoimentos. Foi uma tarde horrivelmente quente e desagradável. Quando levaram o corpo de Berta, Dora ficou com as crianças dentro de casa para que elas não vissem o carro da funerária passando na rua. Adotamos Bubo, o cãozinho de Berta, que estava faminto, sedento e muito assustado. O policial perguntou-nos se conhecíamos alguém a quem pudessem avisar sobre a morte de Berta, mas tudo o que sabíamos era que ela jamais recebia visitas e não tinha parentes. Genaro voltou à casa de Berta à noite, e trouxe em um carrinho de supermercado os mantimentos que encontrou na despensa, alegando que ela não precisaria mais deles... no porão, Renan encontrou várias latas de comida e muitas garrafas de água, o que também recolhemos. Era terrível a sensação de estarmos invadindo, mas Berta realmente não precisaria mais daquelas coisas. 
Aproveitei e levei para casa também alguns vidros de xampu, sabonetes e cremes hidratantes que estavam no banheiro. Chegando em casa, enquanto guardávamos as coisas, fui tomada por uma vontade enorme de chorar, mas segurei-me, para não assustar as crianças. Eu sentia como se estivéssemos fazendo parte de algum daqueles filmes sobre o fim dos tempos, no qual as pessoas entram nas casas vazias para pegar o que puderem. 

Nosso porão e despensa estavam abarrotados, e calculamos que se economizássemos, a comida daria para muitos meses. Genaro começou a procurar um canto mais sombreado no jardim, onde plantou alguns tomates, alfaces e pimentões. A água para rega vinha das sobras da cozinha e dos chuveiros. Decidimos que tomaríamos banhos de dois minutos a cada três dias, embora ainda houvesse muita água no reservatório, pois não sabíamos quanto tempo ficaríamos sem chuvas. As  crianças  passavam bem sem terem que tomar banhos diários, mas eu me sentia horrível. Para mim, era uma das coisas mais difíceis de se fazer. Eu amenizava o calor usando uma toalhinha molhada no corpo, e depois, cremes hidratantes. Dora e os outros faziam o mesmo – tudo para podermos ter água por bastante tempo.

Os dias passaram, e os canteiros de legumes começavam a dar alguns brotos mirradinhos – a água para regas não era suficiente, o que fazia com que as plantas não crescessem muito, mas era tudo o que tínhamos, e Genaro cuidava delas como se fossem seus próprios filhos. Utilizava as cascas de legumes que sobravam, moídas, como adubo; erguera uma proteção sobre a plantação com um tecido escuro, a fim de protegê-la do sol forte. Ele a removia apenas de manhã bem cedo. 

Ainda assistíamos pela TV o caos que estava acontecendo em todo o planeta, com a falta d'água, a crise financeira e o medo das  pessoas, que fazia com que se tornassem cada vez mais violentas. Eu estava muito preocupada com meus filhos, pois desde que me comunicara com eles, há quase dez dias, recebendo a notícia de que estavam voltando ao Brasil, não conseguira mais contatá-los. Tentei a embaixada, que prometeu ajudar-nos, mas mesmo assim, não conseguiam notícias. Diziam que tivéssemos paciência, pois havia muitos casos como o deles. 

A falta de chuvas fez com que o nível dos  rios baixasse drasticamente, causando também falta de energia elétrica durante muitas horas por dia. Era muito difícil conseguir coisas que antes eram simples de serem obtidas, como combustível, água potável, alimentos industrializados, velas, querosene, alguns medicamentos, etc... . 

Em nosso bairro, poucas casas ainda estavam ocupadas, e em nossa rua, especificamente, apenas a nossa. As crianças brincavam com Bubo, o cão de Berta, alheias a tudo o que acontecia em volta delas. Tinham um mundo próprio, e algumas vezes, escutando suas conversas, descobri que brincavam de 'pioneiros'; era algo quer tinham visto na TV. Precisavam sobreviver com muito pouco em uma cidade que estava sendo construída. Eu pensava no quanto os adultos precisavam aprender a ser cmo as crianças de vez em quando e brincar, a fim de aliviar a tensão. 

Eu mesma estava angustiada, e só conseguia pensar em meus filhos. Certa manhã, enquanto todos ainda dormiam, acordei para mais um dia quente, seco e cheio de poeira. Levantei-me da cama, e ao passar pela sala, olhei pela janela e avistei a velha gruta que minha mãe, falecida há anos, mandara construir no nosso jardim. Há quanto tempo eu não ia até lá? De repente, senti uma urgência muito grande de desabafar sobre meus medos com alguém, e dirigi-me sem mais delongas até o local onde ficava a gruta, encrustrada em uma grande parede de pedra natural no jardim, sombreada por um cedro. Enquanto eu olhava para a imagem da Virgem e rezava, senti que as lágrimas que eu vinha tentando conter caíam finalmente, inundando meu rosto. As palavras faziam-se desnecessárias. Eu apenas chorava, olhando o rosto da santa. Foi quando senti o som de passos atrás de mim, e senti uma pequena mão segurar a minha; era Sara.  Ficamos um pouco sde mãos dadas, e ela me sorriu. Disse:

-Eu me lembro de tudo. Sei quem eu sou agora. Sei de onde eu vim.

Ajoelhei-me junto dela, olhando-a nos olhos:

-Que bom, Sara. Conte-me tudo, então.

Ao invés de obedecer-me, ela secou minhas lágrimas com sua mão, perguntando:

-Por que você está chorando?

-Porque estou muito preocupada com meus filhos, querida. Não sei onde eles estão.

Ela fechou os olhos por alguns segubndos, respirando fundo, ainda segurando minha mão, e depois, olhando-me nos olhos, afirmou:

-Não se preocupe; eles estão muito bem. 

-Como você sabe?

-Eu apenas sei. Confie em mim.

Percebi que alguma coisa naquela criança tinha mudado. Ela falava como se fosse um adulto, e seu olhar me tranquilizava de alguma forma, e não sei porquê, eu soube que podia confiar nela, acreditando em suas palavras. Inexplicavelmente, senti que uma onda de alívio tomava conta de mim. 

(continua...)


segunda-feira, 24 de agosto de 2015

O DIÁRIO DO FIM - PARTE II





Apresentei Sara a Bruna e Ian pelo computador. Eles se entreolharam, e tentaram sorrir para a menina, que olhava para eles sem entender como duas pessoas podiam conversar com ela através da “televisão”. Achei incrível que em pleno ano 2019 uma criança daquela idade nunca tivesse visto um computador antes, e compreendi o quanto Sara tinha sido uma criança carente.  Contei a Bruna que a menina estava usando seu quarto, e ela ficou em silêncio durante algum tempo; depois, comentou:

-Mas acho que em breve ela terá uma acompanhante, mãe...

Ela e Bruno se entreolharam de novo, e ele explicou:

-Estamos pensando em voltar. A coisa está muito difícil por aqui. Fui demitido do emprego ontem. E nós sabemos que você e papai não podem mandar mais dinheiro. Acho que não vai dar para pagar o aluguel no mês que vem...

Fiquei preocupada:

-Mas... vocês têm comida? Água?

Foi Bruna quem respondeu:

-Sim, ainda temos água e comida para alguns dias, mas precisamos que vocês comprem as passagens. As coisas lá no meu trabalho também não vão nada bem, vai haver demissões, e tenho quase certeza de que estarei entre os primeiros, já que sou estrangeira; não vai dar para terminar a pós assim. Melhor voltarmos até as coisas melhorarem.

“Até as coisas melhorarem”, pensei. Mas não tinha certeza se aquele dia chegaria. Quando Renan chegou, contei a ele as novidades. Ele pareceu preocupado, mas achou melhor que as crianças voltassem para casa. 


***********************

A água era fria, e escorria pelas minhas costas, aliviando o calor. Em volta, tudo era tão verde, que mais parecia uma pintura. Barulho de chuva, mas o céu estava azul. Barulho de chuva, ficando cada vez mais alto, ensurdecendo-me... a água fria e refrescante tornou-se escaldante de repente. Olhei para cima, e um pássaro colorido cantava num galho de árvore. Parecia um canto agourento. Tudo começou a secar; as folhas iam ficando amarelecidas, douradas e marrons, e logo eram derrubadas por um vento quente. Animais passavam correndo, e caiam mortos no meio do caminho, e no céu o sol se aproximava da terra aos poucos, deixando tudo cada vez mais quente. As gotas de chuva começaram a ficar douradas, e vi que era o sol derretendo. A água ficou dourada, e desceu pelas minhas costas feito lava.

Acordei num sobressalto, sentando-me na cama, a mão na garganta. O calor era sufocante, e notei que o ar condicionado se quebrara. Levantei-me da cama e escancarei as janelas, deixando a brisa morna da noite entrar. No céu, estrelas embaçadas pelo ar poeirento. A lua amarela e cheia parecia rir de nós. 

Na manhã seguinte, Genaro chegou com a notícia:

-Dona Elisabeth, acabo de vir lá da nascente. Secou de vez. 

Meu coração murchou. Jamais pensara que eu viveria para ver aquele momento, aquela época triste. Eu fiquei muda. Durante os cinco anos que morávamos naquele bairro, a água tinha sido sempre abundante, e por isso escolhêramos aquela região. 

Genaro me olhava, apreensivo. Sei que ele pensava que em breve seria demitido. Tentei sorrir, mas formei uma careta:

-A gente pode cavar outra mina... ou poço.

Ele tirou o chapéu, enxugando o suor da testa:

-Não tem mais nenhuma, dona Elisabeth. Há meses venho tentando achar uma, mas está tudo seco. Até as árvores e plantas estão começando a morrer. Bem... acho que no reservatório tem água para mais um ou dois meses. Depois, acho melhor vocês irem embora. Para o sul.

-Mas... está tudo inundado por lá! Vi na televisão que há mais de cem mil mortos, e praticamente toda a população está desabrigada. Estão fugindo de lá. Estão indo para outras regiões.

-É o desespero...mas quando chegarem lá, encontrarão só um deserto. Eles no fundo sabem disso. 

-Mas o governo precisa fazer alguma coisa!

-Não conte com isso, dona Elisabeth. O presidente acaba de dar um discurso na TV dizendo que não tem mais verbas para ajudar ninguém. O governo faliu...

-Mas as Nações Unidas...

-Estão sobrecarregados com o resto do mundo. A Europa toda está um caos só. A África é o reino da fome. Até os estados Unidos estão numa crise horrível, como nunca se viu antes!

Eu sabia de tudo, apenas não queria pensar no assunto. Não discuti com ele. Compreendi que todos estávamos sós, e deveríamos fazer o que fosse possível para continuarmos vivendo, sem contar com a ajuda de ninguém. Ele me olhou nos olhos:

-Eu sei, dona Elisabeth, que é muito difícil para vocês me manterem aqui, e agradeço por tudo; mas eu entendo que a senhora e o ‘seu’ Renan não podem carregar a mim e à minha família nas costas, ainda mais agora que tem mais uma boca para comer (ele olhou para a pequena Sara). Me peguei dizendo:

-E meus filhos estão voltando da Europa...
Ele aquiesceu. Seu olhar era triste, mas conformado. Genaro sabia que não podíamos mais ajuda-lo e à sua família, que tínhamos feito tudo o que era possível.

-Eu me demito, dona Elisabeth.

Senti um nó na garganta:

-Mas... o que você vai fazer? Para onde vai?

-Pra onde tem chuva.

-Mas Genaro... como você vai chegar lá? E quando chegar, onde irá morar? Não há casas, não há lugar seguro, nem mesmo para a população de lá!

-Uma coisa de cada vez... lá a gente vê. Aqui não dá mais. Vou pegar uma carona, mais minha família, em um caminhão de um amigo mais a família dele. 

Naquele instante, vi o carro de meu marido chegando. Fiquei apreensiva, pois ele nunca voltava para casa duas horas depois de ter saído para o trabalho. Antes mesmo de Renan sair do carro, eu já sabia o que tinha acontecido. Ele me olhou, e saiu do carro dizendo:

-Fui demitido. 

Abracei-o, chorando. O que seria de nós, o que seria dos nossos filhos, de Genaro... de todos? 

Ele cumprimentou Genaro, e este lhe disse que estava indo embora com a família:

-Boa sorte para o senhor, e obrigada por tudo, ‘seu’ Renan.

Meu marido aprumou o corpo, e colocando a mão no ombro de Genaro, anunciou:

-As coisas estão difíceis, Genaro. Você não vai conseguir sobreviver com sua família lá fora. Fique aqui conosco.

Genaro ficou com os olhos rasos d’água, e respondeu:

-Obrigada, mas não quero ser um peso para o senhor.

-Já o considero da família, Genaro. Ajudarei como puder. Ainda temos água e comida, e algum dinheiro da minha indenização e economias. Uma mão lava a outra. Confesso que pensei em demiti-lo, mas como fazê-lo, se já nos conhecemos há tantos anos?

Eu interferi:

-Ele acaba de anunciar que as minas secaram.

Mesmo assim, Renan insistiu:

-Não importa. O que acontecer a nós, acontecerá também a vocês. Mudem-se para a edícula com sua família, há dois quartos. Não é muito grande, mas é confortável. Quem sabe, alguma coisa boa acontece no meio de tanta coisa ruim?

Sara escutava a conversa, olhando de um para outro quando falávamos, os olhos azuis arregalados, a boneca apertada junto ao peito. Tinha calçado as sandálias dadas por Renan, e vestia um vestidinho leve de verão. Limpa e penteada, era uma criança realmente muito bela. Eu tinha prendido seu cabelo em um rabo de cavalo, o que deixava seu rosto mais à mostra e mais arredondado. E embora eu não tivesse a intenção de afeiçoar-me a ela, ela e seu silêncio já tinham me cativado.
Genaro apertou a mão de Renan, rendendo-se à oferta.

-‘Seu’ Renan, o senhor sabe que eu tenho mulher mais dois meninos, o Pedrinho e o Luisinho. Mas nós vamos fazer o que pudermos para a ajudar, vamos tentar não ser um peso tão pesado para vocês. 

Renan disse:

-Seria horrível ficarmos sozinhos aqui, Genaro. Todos já se foram, exceto a senhora do final da rua...

Completei:

-Dona Berta. Precisamos ver se ela está bem, se precisa de alguma coisa... bem, ela sempre encomenda do mercadinho. Acho que ela deve estar bem. Não é de muita conversa...

Genaro disse:

-É, mas o mercadinho vai fechar, dona Elisabeth. Ela não vai mais ter de onde encomendar não...
Senti uma grande apreensão ao saber que o mercado do bairro ia fechar, pois sabia que teria que dirigir quase uma hora para fazer compras na cidade. Mas era natural em tempos de crise, e pelas prateleiras quase vazias e os legumes murchos, eu já desconfiara que aquilo acabaria acontecendo.
-Amanhã vamos até lá dar uma olhada. Agora estou cansado e faminto. Vá buscar sua família, Genaro, e venham jantar conosco.

Quando Genaro chegou com a família, sua esposa Dora agradeceu-me, beijando minhas mãos. Tentei evitar, mas ela insistiu, dizendo que nunca tinha visto pessoas tão boas quanto nós, o que me deixou muito constrangida. Sentamo-nos à mesa, comemos e bebemos. Luisinho e Pedrinho eram tímidos, mas notei que sentiram-se mais à vontade quando coloquei-os perto de Sara. As três crianças se entreolhavam e sorriam timidamente. 

Dora me ajudou a tirar a mesa e lavar os pratos, economizando água, como eu ensinara. Ela disse que a partir daquele dia eu não precisava mais me preocupar com os serviços da casa, mas eu a fiz me olhar de frente, e disse:

-Dora, não os chamamos aqui para que fossem nossos empregados. A situação é a mesma para todos. Cada um terá suas tarefas, ninguém deixará de colaborar. Amanhã vamos ao porão e contaremos as latas de comida e os pacotes de cereais, açúcar, sal e macarrão. Também contaremos a água, leite e suco.

-Nós também temos algumas coisas em casa que vamos trazer amanhã. Juntaremos tudo. Não é muito, mas ficaremos felizes em poder dividir.  A laranjeira deu muitos frutos esse ano, dona Elisabeth.

-Me chame de Elisabeth, ok?

(CONTINUA...)




terça-feira, 18 de agosto de 2015

O DIÁRIO DO FIM - PARTE I





O DIÁRIO DO FIM


Era o ano de 2019. Aquele verão fora o mais quente de todos os anos, diziam os noticiários da TV. Os termômetros chegavam a marcar 40 graus à sombra, e mais de 45 ao sol nos dias mais quentes. Eu me sentava em meu jardim, à sombra do velho carvalho, e olhava a grama ressecada e o que restara das plantas. Genaro, meu jardineiro, sugeriu que plantássemos um canteiro de cactos para dar alguma vida ao jardim enquanto as chuvas não chegassem, e eu concordei. E aquele era o único cantinho que emanava alguma vida naquele jardim que já fora um dos mais bonitos das redondezas. 
Genaro também cuidava do poço e da mina d’água. Eu morava em uma tranquila rua sem saída, onde havia poucas casas. A maioria das minas da minha rua já tinham secado, e alguns dos poucos moradores simplesmente fecharam as casas e foram para o sul do país, onde as chuvas torrenciais inundavam as ruas. “Melhor ficar onde tem enchentes do que onde não tem água”, um deles declarou. Todas as outras regiões do país, exceto o sul, que estava inundado pelas enchentes, sofriam por causa da seca prolongada. O clima tinha enlouquecido, e não apenas no Brasil, mas no resto do mundo também. Assistíamos na TV notícias sobre o restante do mundo que falavam de neve na Grécia durante a primavera, frio no verão californiano, derretimento mais acelerado das calotas polares e temperaturas que atingiam 40 graus na Suíça.
 Genaro dizia que a mina que abastecia a nossa casa ainda estava em um bom nível, mas também me aconselhou a economizar o máximo que pudesse e a não “ostentar” muito para evitar olho gordo de vizinho. Dizia: “Em tempos de crise, melhor não mostrar muito, dona Elisabeth”. Achei melhor seguir seu conselho. 
À noite, eu via ao longe as queimadas varrendo as colinas. Diante de tanta seca e tanto calor, como as pessoas podiam tocar fogo no mato daquela maneira? A situação era caótica, mas ninguém parecia dar a importância devida. Afinal, a raça humana tem a estranha mania de achar que as tragédias só acontecem em outros endereços, nunca em suas casas, e algumas pessoas são capazes de reconhecer o caos mesmo estando vivendo dentro dele.
Naquela época, eu tinha quarenta e seis anos e morava sozinha com Renan, meu marido. Meus dois filhos gêmeos de vinte e três anos, Bruna e Ian, moravam e estudavam em Lisboa. Quando nos falávamos, diziam que a situação por lá também não era nada animadora; havia também necessidade de economizar água, pois o racionamento era severo, e as chuvas não chegavam. Além disso, a crise que assolava o país já deixava quase metade da população desempregada. Havia muitas passeatas, e quando eu as via acontecer pela TV, rezava para que Bruna e Ian estivessem em lugar seguro.
Lídia, minha jovem vizinha de trinta e dois anos, dizia que as pessoas estavam exagerando:
-Ouço falar em crise desde que nasci, Elisabeth, e todo mundo sempre reclama que a situação não está boa. Nunca esteve! Acredito que logo tudo voltará ao normal, e nós nos recuperaremos, como sempre tem acontecido. Depois dos suicídios em 1929, a vida continuou e houve grande progresso. E depois dos arrochos salariais, desemprego, casos de corrupção no governo e tantos outros problemas, que começaram no Brasil por volta de 2012, todo mundo tem sobrevivido e seguido em frente. Assim foi, tem sido e será!
Mas Lídia não pode continuar sustentando seu discurso quando a firma de software onde trabalhava fechou e  demitiu todos os funcionários, sem pagar os seus direitos, e ela teve que ir embora e voltar a viver com os pais em Curitiba. Saiu sem nada, pois nem sequer a casa conseguira vender. Ninguém tinha dinheiro para comprar, e mesmo se tivessem, quem compraria uma casa onde não havia mais água? Algumas pessoas só sentem a crise quando ela bate à porta. Lídia e eu nos despedimos em uma tarde de quinta-feira, no portão de minha casa. Ela me abraçou chorando, entrou no carro e partiu. Sua casa juntou-se à longa fileira de casas com portas e janelas fechadas e jardins mortos da minha rua. 
Ainda havia, no final da rua, em uma casa antiga e castigada pelo tempo e a falta de cuidados,  uma velha senhora que vivia sozinha e não tinha filhos que se chamava Berta. Devia estar com setenta anos, e nunca fora muito sociável. Poucas vezes tínhamos conversado com ela, e certa vez, quando a bola das crianças que brincavam na rua caiu em seu terreno, ela a jogou furada por cima do muro. Ela não saía de casa, e costumava encomendar no mercado local as coisas que precisava para viver, como comida, água e outros produtos. Eu sabia, pois já vira o caminhãozinho do mercado parar em frente ao seu portão várias vezes.
Eu saía de vez em quando para dar uma caminhada pelo bairro. Era um lugar tranquilo e bonito, com um pequeno centro comercial a mais ou menos duzentos metros de distância de nossa casa. Levava a sombrinha aberta para obter alguma sombra, já que o calor do sol era causticante, e mesmo assim, ficava com a pele avermelhada. Ia ao armazém buscar alguns legumes – que estavam cada vez mais absurdamente caros devido às dificuldades de plantio e cultivo. Eu e meu marido íamos nos virando conforme dava...  a água estava cada vez mais cara, e apenas alguns podiam contar com o benefício dos carros pipa. Eu tinha em casa quase uma centena de litros d’água armazenados no porão. Tinham sido comprados aos poucos, durante meses. Meu marido, que trabalhava em uma firma de meteorologia, dizia que mais tarde precisaríamos deles, e eu lamentei muito ter que admitir que ele estava certo quando a hora chegou.
Conversando com o dono do armazém, ouvi-o dizer, desanimado, que estaria fechando as portas em alguns dias, pois a falta d’água, a diminuição do número de clientes e o encarecimento das mercadorias o obrigavam a isto.
Em uma das minhas caminhadas, após comprar meio quilo de batatas e algumas maçãs que começavam a murchar, deparei com uma menina. Sentada à beira da calçada, descalça, suja e muito magrinha, ela chorava baixinho. Aparentava ter por volta de cinco ou seis anos. Tinha cabelos pretos e muito lisos, embora sujos. Era uma criança bonita, mas muito maltratada. Aproximei-me dela e perguntei seu nome, e ela me olhou assustada e desconfiada. Repeti a pergunta, e ela murmurou: “Sara.” Olhei-a durante mais algum tempo antes de abaixar-me para poder ver seu rosto melhor. Lágrimas sujas escorriam pela face da menina. 
-Por que você está chorando, Sara? Cadê sua mãe?
Ela não respondeu, secando os olhos com as costas da mão. Repeti a pergunta, e ela disse que não sabia onde a mãe estava, e nem se lembrava onde morava.
-Há quanto tempo você está sozinha?
Ela encolheu os ombros.
-Mas para onde foi sua família?
-Não sei... eu acordei um dia e eu estava sozinha.
-Você tem irmãos? Tios?
Ela negou com a cabeça.
-E quem está cuidando de você?
-Ninguém.
Levantei-me, respirando fundo; não podia deixar aquela criança ali, sozinha, debaixo daquele sol. Abri a garrafinha de água que tinha levado comigo e ofereci-lhe um gole do que tinha sobrado – quase meia garrafa. Ela bebeu tudo. Peguei na mão dela, e levei-a comigo. Sara não tentou impedir-me, apenas seguiu ao meu lado. Fui conversando com ela, tentando saber mais:
-O que você tem comido nesses dias, Sara?
Ela não respondeu; novamente encolheu os ombros, olhando para o chão; parecia estar muito confusa.
-E você tem estado sozinha o tempo todo? Ninguém cuidou de você?
Mais uma vez, ela negou com a cabeça. 
-Onde estão seus vizinhos?
-Não sei... – e ela começou a chorar de novo.
Mil pensamentos e sentimentos me atormentavam; eu tinha plena consciência de que precisava ajudar aquela menina, mas ao mesmo eu pensava em quantas mais havia como ela naquele momento. Além do mais, eu e meu marido também estávamos com dificuldades, pois com a inflação cada vez mais alta, o dinheiro ia ficando cada vez mais curto para podermos comprar o que precisávamos para nos sustentar. Ele já tinha cogitado sobre demitir Genaro, mas e sabíamos que ele era pai de dois meninos ainda pequenos – de onze e treze anos - e que ficaria em grandes dificuldades se nós o demitíssemos, já que a maioria de seus antigos clientes já o fizera. Além de nós, naquele momento difícil Genaro contava com apenas uma outra casa onde trabalhar. 
Ao chegarmos em casa, sentei a menina à mesa da cozinha e servi-lhe uma refeição – arroz, feijão salada e carne, que ela devorou rapidamente, pedindo mais um pouco. Depois, comeu uma maçã e bebeu quase meio litro de suco de laranja. Notei que seu rosto já ganhara alguma cor. Ao terminar sua refeição, Sara ficou me olhando timidamente, enquanto brincava de enrolar uma mecha de cabelo no dedo. Parecia estar esperando que eu a mandasse embora. Mas eu sabia que não poderia fazê-lo. 
Levei-a até o banheiro, e coloquei-a sob o chuveiro, dando-lhe um sabonete. Massageei seu cabelo com um pouco de xampu, e enrolei-a em uma toalha, levando-a no colo até o quarto de minha filha Bruna. Vesti-lhe uma camiseta, que ficou bem grande, mas era o que eu tinha no momento, e mandei que ela ficasse ali, dando-lhe uma das antigas bonecas de minha filha. 
Telefonei ao meu marido:
-Por favor, veja se consegue roupas de menina. Aparentemente, seis anos de idade.
Ao passar pelo quarto, ainda ao telefone, olhei-a e vi que tinha caído no sono na cama de minha filha, abraçada à boneca. Fechei as venezianas e deixei-a descansar, ligando o ventilador para refrescar o calor do quarto. 
Enquanto isso, meu marido indagou:
-Como assim, roupas de criança para quem?
-Uma menina. Recolhi-a na rua, estava sozinha. Chorava, tinha fome e sede. 
Silêncio. Ouvi a respiração profunda de Renan, e senti sua reprovação. Há dias ele tinha me impedido de recolher um cão perdido, dizendo que não podíamos salvar todo mundo, mas desta vez, tratava-se de uma criança, e eu disse isso a ele. Senti sua desaprovação no tom da voz, quando antes de desligar, ele disse:
-Está bem.
À noite, quando Renan chegou em casa, eu e Sara assistíamos TV. Ela não falava muito, e eu não pretendia afeiçoar-me muito a ela, e então não puxei conversa. Ficava o tempo todo segurando a boneca como se ela fosse uma tábua de salvação, e não me olhava nos olhos. Quando eu falava com ela, respondia ‘sim’ ou ‘não’ apenas balançando a cabeça, olhando sempre para meus pés. Renan olhou-a, e beijou-me a testa. Apresentei-o a Sara:
-Sara, este é Renan, meu marido. 
Ela olhou-o, mas nada disse. Apertou mais a boneca. Ele ajoelhou-se perto dela, e ela afastou o corpo ligeiramente. Renan estendeu a ela duas bolsas:
-Veja Sara, são para você. O que acha de ir lá dentro e vestir o pijama? Você sabe o que é um pijama?
-Ela apanhou a bolsa, sinalizando ‘sim’ com a cabeça, e saiu correndo em direção ao quarto, carregando as bolsas em uma mão e a boneca na outra. 
-Comprei também um par de sandálias para ela, espero que sirvam. 
Ficamos nos olhando, e ele me abraçou, e depois foi trocar de roupa. 

(CONTINUA...)




A RUA DOS AUSENTES - Parte 4

  PARTE 4 – A DÉCIMA TERCEIRA CASA   Eduína estava sentada em um banco do parque. Era uma cinzenta manhã de quinta-feira, e o vento frio...