quinta-feira, 19 de junho de 2014

A Terra do Sonho Possível




Era uma vez um reino distante, como tantos reinos distantes que existem por aí em muitas histórias. Seria apenas mais um, não fosse por uma pequena diferença: neste reino distante, todos que nasciam recebiam de presente o direito a um único pedido mágico, que fosse qual fosse, se realizaria. A única condição é que nenhum pedido poderia ser retirado, ou seja: a partir do momento que alguém escolhia determinada coisa, teria que conviver com ela para sempre!

Bem, até o momento, você deve estar pensando o quanto gostaria de viver em um lugar assim! Imaginem só, ter direito a um desejo mágico, fosse qual fosse, e vê-lo realizado num piscar de olhos? Realmente, este reino deve ser um lugar onde todos são felizes...

Mas não é assim que acontece. Porque as pessoas sempre se precipitavam ao fazerem seus desejos, e acabavam pedindo coisas estúpidas; por exemplo, havia um menino de oito anos que pediu que a avó a quem ele tanto amava e que acabara de falecer após anos de doença e sofrimento, pudesse voltar à vida. Ele sempre a vira feliz e sorridente, pois a boa senhora tentava esconder suas mazelas e dores do menino, procurando sempre aparentar estar sentindo-se bem. Assim, quando ela se foi, o menino acreditava que sua avó era uma pessoa feliz e saudável. Quando ela finalmente descansou e acordou no paraíso, livre de todas as suas dores e sofrimentos, mal pode dar dois passos em direção à luz e sentiu-se puxada de volta para um túnel escuro, e despertou novamente em seu velho corpo doente.

Os olhos do menino brilharam de alegria ao rever sua querida avó, e ele confessou: "Que dia feliz, vovó! acabo de usar meu pedido mágico para trazê-la de volta!" Entre espasmos de dor, a avó retrucou: "Você não sabe o que fez, menino... condenou-me a uma eternidade de sofrimentos e dores ao seu lado, e eu o odeio por isso!"

A Grande Lei dizia que aquele que fez o pedido deveria conviver com ele até o final dos seus dias, e durante quase oitenta anos, o menino (que cresceu e tornou-se um velho amargo e solitário, pois nenhuma mulher jamais casou-se com ele devido às imprecações de sua avó) foi obrigado a conviver com sua avó, agora uma pessoa amarga e infeliz, que gemia de dores todas as noites no quarto ao lado do seu, proferindo muitos palavrões.

Como a história deste menino, havia milhões de outras, sobre pessoas que desejaram ter de volta um ente querido, o que fez com que o reino encantado passasse a ser um lugar superpopulado e habitado por muitos seres taciturnos e entristecidos, pois ninguém que tenha visto o outro lado da vida, deseja voltar.

Há também a história do homem que desejou ser rico e famoso; como esta, há milhões de histórias parecidas, de pessoas que se tornaram cantores famosos, dançarinos, mágicos, escritores, etc, e perderam o prumo de suas vidas. Este nosso amigo imediatamente adquiriu o dom da pintura, e passou a pintar quadros maravilhosos que fizeram dele um homem cada vez mais rico, famoso e vaidoso. A mulher dos seus sonhos, não aguentando mais viver sob sua sombra egoísta, acabou por deixá-lo, e ele amargou o resto de sua vida em um mundo fútil e superficial. Até desejou não mais ser rico e famoso, mas aonde quer que fosse, era assediado por repórteres que escreviam mentiras sobre ele e pessoas interesseiras que queriam aparecer como seus amigos.

Algumas pessoas pediam que alguém que não era apaixonado por elas  as amassem. Assim, muitos casamentos e noivados eram destruídos, e às vezes, a pessoa que fez o pedido percebia que o príncipe ou princesa encantados não passavam de rãs e sapos... mas tinham que conviver com eles para sempre. E mesmo tendo como exemplo várias histórias infelizes, as pessoas sempre acabavam achando que com elas, seria diferente.

Pessoas que estavam envelhecendo pediam para voltar a serem jovens novamente, e se esqueciam que isto significava que permaneceriam jovens enquanto seus entes queridos envelheciam e morriam. Estas pessoas tornavam-se imortais, e amargavam uma eternidade dedicada ao arrependimento e à saudade.

Enfim; as pessoas faziam os pedidos mais loucos do mundo, e sempre causavam grandes desastres, pois a maioria dos seres humanos pensava somente em si e em seus próprios desejos, recusando-se a aceitar a vida como ela era - e é assim que ela deveria ser. Nosso reino encantado tornou-se um lugar sombrio, onde seres infelizes competiam uns com os outros e temiam que alguém fizesse algum tipo de desejo destinado a destruí-los - e havia muita gente que desperdiçava seus desejos desejando o mal para os outros.

Mas lá de cima, alguém olhava por aqueles seres egoístas e insensatos, e resolveu finalmente mandar-lhes ajuda. Assim, brandiu uma varinha de condão e decretou que a partir daquele dia, os desejos humanos, concedidos ao nascer, estariam abolidos.

Ao saberem de tal coisa, os seres do reino encantado ficaram indignados, mas com o tempo, descobriram que teriam que aceitar a decisão tomada pelo Ser Superior. Pouco a pouco, com o passar dos anos, o reino foi tornando-se um lugar melhor. Mesmo assim, uma semente atávica descansa na alma de todos os seres humanos, e isto faz com que, até os dias de hoje, desejemos coisas estúpidas, egoístas e impossíveis.





4 comentários:

  1. Que belo conto, Ana! Ler você é sempre um prazer incomensurável que, inclusive, leva a profundas reflexões, como nesse contexto, no qual você deixa patenteado o perfeccionismo das coisas da vida pelas mãos de Deus. Adorei, querida amiga. Parabéns e um abraço com o carinho e a admiração de sempre.

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  2. Genial minha amiga! Você surpreende a cada texto, a cada conto, a cada poema que escreve. Esse foi seu dom, sem pedir, sem hesitar e vc o levará pra sempre.

    Beijo de afeto
    Lu C.

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  3. Olá Ana.
    Este seu conto torna o sonho assustador, e na realidade, se essa possibilidade houvesse, seria um desfecho semelhante a este que se teria, não?
    Pois que tantas vezes na vida, julgamos estar a viver uma felicidade que afinal acaba por se mostrar um desastre, um inferno.
    Muito bom
    Bjo amigo

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