Era uma vez um reino distante, como tantos reinos distantes que existem por aí em muitas histórias. Seria apenas mais um, não fosse por uma pequena diferença: neste reino distante, todos que nasciam recebiam de presente o direito a um único pedido mágico, que fosse qual fosse, se realizaria. A única condição é que nenhum pedido poderia ser retirado, ou seja: a partir do momento que alguém escolhia determinada coisa, teria que conviver com ela para sempre!
Bem, até o momento, você deve estar pensando o quanto gostaria de viver em um lugar assim! Imaginem só, ter direito a um desejo mágico, fosse qual fosse, e vê-lo realizado num piscar de olhos? Realmente, este reino deve ser um lugar onde todos são felizes...
Mas não é assim que acontece. Porque as pessoas sempre se precipitavam ao fazerem seus desejos, e acabavam pedindo coisas estúpidas; por exemplo, havia um menino de oito anos que pediu que a avó a quem ele tanto amava e que acabara de falecer após anos de doença e sofrimento, pudesse voltar à vida. Ele sempre a vira feliz e sorridente, pois a boa senhora tentava esconder suas mazelas e dores do menino, procurando sempre aparentar estar sentindo-se bem. Assim, quando ela se foi, o menino acreditava que sua avó era uma pessoa feliz e saudável. Quando ela finalmente descansou e acordou no paraíso, livre de todas as suas dores e sofrimentos, mal pode dar dois passos em direção à luz e sentiu-se puxada de volta para um túnel escuro, e despertou novamente em seu velho corpo doente.
Os olhos do menino brilharam de alegria ao rever sua querida avó, e ele confessou: "Que dia feliz, vovó! acabo de usar meu pedido mágico para trazê-la de volta!" Entre espasmos de dor, a avó retrucou: "Você não sabe o que fez, menino... condenou-me a uma eternidade de sofrimentos e dores ao seu lado, e eu o odeio por isso!"
A Grande Lei dizia que aquele que fez o pedido deveria conviver com ele até o final dos seus dias, e durante quase oitenta anos, o menino (que cresceu e tornou-se um velho amargo e solitário, pois nenhuma mulher jamais casou-se com ele devido às imprecações de sua avó) foi obrigado a conviver com sua avó, agora uma pessoa amarga e infeliz, que gemia de dores todas as noites no quarto ao lado do seu, proferindo muitos palavrões.
Como a história deste menino, havia milhões de outras, sobre pessoas que desejaram ter de volta um ente querido, o que fez com que o reino encantado passasse a ser um lugar superpopulado e habitado por muitos seres taciturnos e entristecidos, pois ninguém que tenha visto o outro lado da vida, deseja voltar.
Há também a história do homem que desejou ser rico e famoso; como esta, há milhões de histórias parecidas, de pessoas que se tornaram cantores famosos, dançarinos, mágicos, escritores, etc, e perderam o prumo de suas vidas. Este nosso amigo imediatamente adquiriu o dom da pintura, e passou a pintar quadros maravilhosos que fizeram dele um homem cada vez mais rico, famoso e vaidoso. A mulher dos seus sonhos, não aguentando mais viver sob sua sombra egoísta, acabou por deixá-lo, e ele amargou o resto de sua vida em um mundo fútil e superficial. Até desejou não mais ser rico e famoso, mas aonde quer que fosse, era assediado por repórteres que escreviam mentiras sobre ele e pessoas interesseiras que queriam aparecer como seus amigos.
Algumas pessoas pediam que alguém que não era apaixonado por elas as amassem. Assim, muitos casamentos e noivados eram destruídos, e às vezes, a pessoa que fez o pedido percebia que o príncipe ou princesa encantados não passavam de rãs e sapos... mas tinham que conviver com eles para sempre. E mesmo tendo como exemplo várias histórias infelizes, as pessoas sempre acabavam achando que com elas, seria diferente.
Pessoas que estavam envelhecendo pediam para voltar a serem jovens novamente, e se esqueciam que isto significava que permaneceriam jovens enquanto seus entes queridos envelheciam e morriam. Estas pessoas tornavam-se imortais, e amargavam uma eternidade dedicada ao arrependimento e à saudade.
Enfim; as pessoas faziam os pedidos mais loucos do mundo, e sempre causavam grandes desastres, pois a maioria dos seres humanos pensava somente em si e em seus próprios desejos, recusando-se a aceitar a vida como ela era - e é assim que ela deveria ser. Nosso reino encantado tornou-se um lugar sombrio, onde seres infelizes competiam uns com os outros e temiam que alguém fizesse algum tipo de desejo destinado a destruí-los - e havia muita gente que desperdiçava seus desejos desejando o mal para os outros.
Mas lá de cima, alguém olhava por aqueles seres egoístas e insensatos, e resolveu finalmente mandar-lhes ajuda. Assim, brandiu uma varinha de condão e decretou que a partir daquele dia, os desejos humanos, concedidos ao nascer, estariam abolidos.
Ao saberem de tal coisa, os seres do reino encantado ficaram indignados, mas com o tempo, descobriram que teriam que aceitar a decisão tomada pelo Ser Superior. Pouco a pouco, com o passar dos anos, o reino foi tornando-se um lugar melhor. Mesmo assim, uma semente atávica descansa na alma de todos os seres humanos, e isto faz com que, até os dias de hoje, desejemos coisas estúpidas, egoístas e impossíveis.
Que belo conto, Ana! Ler você é sempre um prazer incomensurável que, inclusive, leva a profundas reflexões, como nesse contexto, no qual você deixa patenteado o perfeccionismo das coisas da vida pelas mãos de Deus. Adorei, querida amiga. Parabéns e um abraço com o carinho e a admiração de sempre.
ResponderExcluirGenial minha amiga! Você surpreende a cada texto, a cada conto, a cada poema que escreve. Esse foi seu dom, sem pedir, sem hesitar e vc o levará pra sempre.
ResponderExcluirBeijo de afeto
Lu C.
Olá Ana.
ResponderExcluirEste seu conto torna o sonho assustador, e na realidade, se essa possibilidade houvesse, seria um desfecho semelhante a este que se teria, não?
Pois que tantas vezes na vida, julgamos estar a viver uma felicidade que afinal acaba por se mostrar um desastre, um inferno.
Muito bom
Bjo amigo
Adorei o final...
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