segunda-feira, 27 de abril de 2020

MADRE - Capítulo 12





MADRE - Capítulo 12

Saímos da loja carregadas de pacotes. Ela disse que iria ao estacionamento colocar tudo no carro e me pediu que a esperasse na praça de alimentação, em um café chique. Fiquei por lá, olhando minha mãe se afastar e se perder na multidão de pessoas alegres. Minutos depois, pedi uma Coca, e quando comecei a tomar, vi minha mãe voltando. Ela parecia preocupada, mas o que mais me chamou a atenção, é que ela estava usando roupas diferentes da que tinha. Usava um par de calças jeans, um suéter bege com um lenço de seda rosa amarrado ao pescoço e um par de botas de camurça marrom até os joelhos. Estranhei, pois quando me deixou, ela estava usando um vestido verde musgo!

Pensei no quanto Mayara era imprevisível, e ri, mas meu sorriso se fechou quando notei que a mulher que vinha em minha direção não era minha mãe; seus cabelos eram ligeiramente mais curtos e mais escuros, embora ela fosse quase igual a Mayara e tão bonita quanto. Parecia muito nervosa e seu rosto estava avermelhado, suando na testa. Quase derramei meu refrigerante quando ela se sentou diante de mim e me olhou nos olhos profundamente. Disse:

-Não tenho muito tempo. Se ela descobrir que eu a encontrei, vai fugir de novo. Meu nome é Mércia, sou irmã de Mayara. Gêmea. 
Minha cabeça deu um nó:

-Quem??? Então... você é minha tia??? Mas minha mãe me disse que não tinha parentes!

Ela escorregou um cartão de visitas sobre a mesa até mim, e colocou-o na palma da minha mão, dizendo: 

-Venha me ver assim que puder! E por favor, é muito importante que minha irmã não saiba de nada. Não diga a ela que me conheceu, por favor, ou você nunca mais saberá da verdade...

Ela baixou os olhos, e levantando-se apressadamente da mesa, desapareceu na multidão, descendo as escadas rolantes. Ainda olhou para trás antes que eu a perdesse de vista. Enfiei o cartão na bolsa sem olhar para ele, pois avistei minha mãe se aproximando, com um baita sorriso no rosto, caminhando em minha direção. Fiz de tudo para disfarçar o que tinha acontecido, mas ela notou que havia algo estranho. Disfarcei, dizendo que não estava me sentindo muito bem e que deveria ter sido o camarão do almoço que comêramos mais cedo. Ela franziu a testa, e disse que assim que chegássemos em casa, daria uma bronca na cozinheira. Lamentei silenciosamente pela pobre cozinheira, que pagaria o pato por nada! Ainda tentei persuadir Mayara a esquecer o assunto, mas ela disse:

- Aisha, Meus empregados domésticos recebem quase seis vezes mais do que os empregados domésticos geralmente recebem! Cada um têm um carro à disposição, acomodações na casa, caso desejem morar lá ou passar a noite, e todos os seus direitos legais assegurados. O mínimo que eu exijo, é competência e um trabalho impecável. Não admito que tenha sido preparado qualquer coisa na minha cozinha que não seja absolutamente fresco.

-Eu sei, Mayara! Mas você comeu e não está passando mal, não é? Eu é que sou muito sensível a camarões. Olha, tomei esse refrigerante e já estou começando a me sentir melhor. Só vou ao banheiro um instantinho para lavar o rosto.

Ela insistiu para ir comigo, mas eu disse que estava bem, só ia lavar o rosto e voltar logo.

Chegando no banheiro, procurei o privativo e, batendo a porta, deixei que as emoções aflorassem. Me vi trêmula, ofegante e confusa. Fiquei ali pelo menos cinco minutos, tentando entender os últimos acontecimentos: Mayara mentira para mim! Disse que não tinha família, mas tinha uma irmã gêmea. O que mais ela tinha me escondido? Eu teria que procurar por minha tia para saber. Coloquei a mão dentro da bolsa e li o cartão três vezes antes de colocá-lo de volta na bolsa. Mas depois, não sei o porquê, anotei o número do telefone em meu celular com um nome fictício e joguei o cartão fora. Fiquei com medo que Mayara vasculhasse minhas coisas e o encontrasse. Eu precisava tomar cuidado, afinal, não sabia quem ela realmente era. 

Lavei o rosto com água gelada, respirei fundo e ensaiei um sorriso tranquilo antes de juntar-se novamente à minha nova mãe. 

Ao chegar em casa, mandei uma mensagem de texto para minha tia Mércia e marcamos de nos encontrar dali a dois dias. Seria um dia antes da festa de Dalva, amiga de minha mãe.  Eu só precisava de uma desculpa para justificar minha saída para Mayara. Me vi pensando no porquê estar pensando em uma desculpa para poder sair, e aquilo me preocupou. Eu tinha acabado de sair da prisão que era viver fugindo e me escondendo com meus pais, e agora, que eles não estavam mais vivos, eu temia encarar Mayara e continuava me achando presa, tendo que arranjar desculpas para sair. Eu não precisava daquilo! Pelo menos, não deveria precisar. 

Naquela noite, eu não dormi. Tive uma crise de ansiedade terrível e quase fui acordar minha mãe quando a crise chegou ao ápice. Abri a porta da sacada e fui lá para fora, onde uma enorme lua branca parecia me espiar. Olhei fixamente para ela e fui tentando colocar a respiração em um nível suportável novamente, bebericando água e tentando me controlar. Engoli um comprimido para ansiedade, me sentindo péssima, já que eu queria muito deixar de toma-los e estava quase conseguindo. Porém, meus braços dormentes, o coração disparado, a pele coberta de suor, o pânico... tudo aquilo me obrigava a engolir mais um comprimido, sempre me prometendo que seria o último. Logo eles iriam acabar e eu precisaria de uma nova receita. Meu médico estava há quilômetros de distância e eu não tinha nenhum dinheiro. Teria que acabar contando a Mayara sobre o meu problema. 

Lembrei-me muito de meus pais. Senti muita saudade deles, apesar de tudo. Pensei em minha avó e em meus amigos da escola. Eu conversava com eles pela internet agora, mas as conversas online não eram suficientes para manter uma amizade! Eu gostaria de estar com eles... ou esquecê-los de vez e tentar me adaptar à minha nova vida, fazendo alguns amigos. Mas... que nova vida? Eu ia continuar morando com Mayara depois que ouvisse o que Mércia tinha a me dizer? Ou voltaria a viver com minha avó e com Tina?


(continua...)







5 comentários:

  1. Mais um brilhante e, interessante capitulo! Parabéns.
    -
    O que diz o meu olhar
    Beijos e uma excelente semana.

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  2. E assim a Estória continua super interessante

    Acompanhando

    Cuide-se

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  3. Absolutely riveting...I love how the tension builds with each chapter, drawing the reader ever more deeply into the fantastic story!
    Each time, I am left hungry for more...😊😊

    Have a great day...and stay safe!

    Love and hugs xxx

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  4. Ana , mais capítulos .
    Muito bom acompanhar a vida desta menina .
    Beijos

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  5. Bom dia Ana,
    E de capítulo em capítulo estás a construir uma linda e interessante Estória.
    Obrigada por passar lá no Café Poético e deixar suas impressões sobre o poema.

    Feliz semana,

    Abração

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