domingo, 4 de agosto de 2013

ADEUS, SETEMBRO!





Era a última chuva de primavera, e ela tentava manter-se seca sob o guarda-chuva, enquanto esperava. Aquele local, que tinha sido palco de uma dolorosa despedida há um ano, fora também escolhido como o local de um promissor reencontro. Tratava-se de um parquinho infantil, desses com balanços, gangorra, muitas árvores, banquinhos onde as mães se sentavam para observar suas crianças brincando, vendedores de balões coloridos, carrocinhas de pipoca, algodão doce e música de realejo.

Mas hoje, ele estava vazio. Exceto pela presença dela, e das lembranças que desfilavam diante de seus olhos e se dissolviam nas poças d'água. A chuva caía seguindo sempre o mesmo rítimo, quase intensa, formando uma cortina entre ela e o restante da paisagem. Apesar do atraso, ela esperava.

Tinham um encontro marcado. O fato de terem se separado, há um ano, não significava o fim. Ele precisou partir por motivos além de sua vontade: fora convocado para trabalhar nas forças de paz do exército, em um país distante. No começo, trocavam cartas e e-mails apaixonados, mas cinco meses depois de sua partida, as cartas e e-mails cessaram sem aviso prévio. Dias deppois, ela recebeu uma carta oficial, que dizia que ele tinha desaparecido. 

Ela não se desesperou, como os outros. Sabia que ele não era homem de não cumprir as promessas que fazia. Ao despedir-se dela, jurou encontrá-la novamente naquele mesmo local, onde se separaram, e por isso, ela estava ali. Seu desejo de revê-lo era tão forte, que ela seria capaz de esperar por ele a vida toda. bastaria que houvesse um fio de esperança, apenas, bastaria que ele continuasse desaparecido. Ela esperaria. A vida toda.

Quando chegou setembro, ela pareceu encher-se de vida. Atravessar aquela primavera seria como viver a antecipação de reencontrá-lo, portanto, ela apreciou cada cor, cada flor, cada momento daquela estação. Alguns pensavam até que ela o tinha esquecido, devido a sua vivacidade. Mas ela - só ela - sabia que sua alegria era a certeza (não mais a esperança) que gritava dentro dela, que, ao final daquela estação, exatamente no último dia de primavera, ele voltaria, como tinha prometido. Dali em diante, todos os dias seriam dias de setembro.




Duas horas se passaram. A chuva foi diminuindo aos poucos, e as nuvens foram descortinando um céu alaranjado de final de tarde. Vapores começaram a subir das copas das árvores, e passarinhos cantavam, despedindo-se da primavera. Mas ela não foi embora; sentou-se em um dos bancos da pracinha, sentindo que o grito de certeza dentro dela aos poucos tornava-se um rouco murmúrio de esperança.

Foi quando ela viu surgir, do meio da névoa, uma figura masculina em um sobretudo escuro. Levantou-se, coração aos pulos, e prendeu o olhar naquela direção. Queria ter certeza. E teve: era ele! Aos poucos, ele se aproximava, parecendo mais flutuar em direção a ela do que caminhar. Ela quis correr em direção a ele, e surpresa, percebeu que seus pés estavam grudados no chão. Seria emoção?

Finalmente, ele parou diante dela. Ela podia ver a nuvem de vapor que emanava dos cabelos dele, e viu-se refletida dentro de suas pupilas. Mas quando tentou tocá-lo, não pode fazê-lo: era incapaz de erguer o braço, como se uma força a mantivesse imovel.

Ela ouviu - ou sentiu - o pensamento que vinha dele, em uma única palavra: "Continue." 

Aos poucos, ela compreendeu que ele não estava mais ali. Não fazia mais parte de seu mundo. Tinha vindo apenas cumprir uma promessa. Viu quando uma lágrima rolou no rosto dele, e sentiu que elas rolavam sobre seu rosto em profusão.

De repente, a imagem dele foi se afastando cada vez mais, até desaparecer pelo mesmo caminho de onde tinha surgido. Ela sentiu-se rodeada por um silêncio intenso, mas pouco a pouco, passou a ouvir novamente o canto dos pássaros e barulhos de carros na estrada próxima. A tarde já estava tingida por um intenso tom avermelhado, e olhando para o céu, ela avistou a primeira estrela.

Suspirou fundo, tentando compreender o que ela tinha acabado de vivenciar. Depois, despediu-se de setembro.



4 comentários:

  1. Olá Ana!

    Muito bonito o conto. Pena que ele já não estava entre os vivos, porém, cumpriu a sua promessa.
    Por motivos de saúde, tenho estado ausente dos blogs amigos. Desculpa. Estou retomando.
    Obrigada pelo carinho e compreensão.

    Beijinhos,

    Cris Henriques

    http://oqueomeucoracaodiz.blogspot.com

    NOVO!! http://jakeemary.blogspot.com/2013/08/capitulo-10-red-e-lucy.html

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  2. ANA. DETALHE QUE O TÍTULO JÁ É SÚPER CONVIDATIVO, E O DECORRER DO TEXTO, ME PRENDEU E FOI MELHOR DO QUE IMAGINAVA, A IMAGEM MAIS LINDA AINDA, AMEI ELA TER CONSEGUIDO PERCEBER QUE ELE NÃO FAZIA MAIS PARTE DAQUELE MUNDO.

    AMO TUA INSPIRAÇÃO. BJS!

    PATTY.

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  3. Que belo conto, Ana! Uma promessa cumprida e uma libertação. Bjs.

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  4. Ai meus sais, que triste... Contudo ele veio, e ela ficou em paz. Não importava o resto porque aquele setembro seria o início de uma nova vida.

    Estrela a brilhar
    e a moça a caminhar!

    Adoooro e sou tua fã.
    bacios

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