quarta-feira, 2 de outubro de 2013

AREIAS DE UM TEMPO SEM FIM - PARTE III - FINAL




Quando abriu os olhos, Ingrid percebeu que estivera desmaiada por algum tempo, já que o sol já se erguia alto no céu. Testou os músculos do corpo e dobrou as pernas vagarosamente, verificando se estaria ferida. Sentiu apenas uma fraca dor nas costas - caíra deitada - mas estava bem. Levantou-se devagar; pegou seu chapéu, colocando-o na cabeça e amarrando bem a fita sob o queixo para não perdê-lo novamente.  Começou o caminho de volta, subindo o penhasco e segurando-se bem. Era bem mais fácil subir do que descer.

Ao chegar à plataforma, procurou pela mancha de sangue no vestido, mas achou-o imaculadamente branco. Também surpreendeu-se ao perceber que o feio corte da mão não estava mais lá. Talvez tivesse imaginado tudo, devido ao susto da queda.

Voltou para casa, caminhando lentamente. O dia estava maravilhoso, e a temperatura, muito agradável. Parecia-lhe que as cores estavam mais vivas do que nos últimos dias, e a sensação de melancolia que a acompanhara durante aquele triste período de sua vida, tinha estranhamente desaparecido... Ingrid sentia-se leve e cheia de vida. 

A subida da colina não a deixou cansada; pelo contrário: ao chegar à casa, ela olhou o mar lá embaixo e respirou fundo, tendo a impressão de que o marulhar das ondas estava mais intenso, e havia no ar um agradável perfume de flores que ela não havia notado antes. Notou que havia pássaros azuis pousados na árvore próxima - espécies que ela não conhecia. Ficou algum tempo admirando-os.

Foi quando ela ouviu uma voz conhecida chamando-a de dentro da casa.



Seu coração deu um salto: era a voz de Tia Agnes! Perplexa, Ingrid entrou correndo na casa. Deveria ser o efeito do sol. Tinha que ser! Mas ao passar porta aberta, seguindo a voz que a chamava até a sala de almoço, viu a mesa pronta decorada com alguns vasos de flores como Agnes costumava fazer, e mal pode acreditar ao ver Tia Agnes de pé junto a ela, terminando de arrumar os copos, mais bela e jovem do que jamais vira. Usava um vestido esvoaçante e delicado de cor amarelo-pálido, tinha a pele levemente bronzeada e sem rugas. Ingrid achou que parecia muitos anos mais jovem do que quando a conhecera. 

Agnes saudou-a alegremente, dizendo:

-Não fique parada aí! Entre logo, pois estávamos esperando por você!

Ingrid adentrou a casa, e com os olhos cheios de lágrimas, achou que estava sonhando. Aproximou-se de Agnes, abraçando-a forte. Agnes pareceu adivinhar-lhe os pensamentos, e disse:

-Não é um sonho, cara Ingrid. Você está mesmo aqui. É real!
-Mas como pode ser, Tia Agnes? Você já... quero dizer, eu fui ao seu... velório, e...
-Mas isso foi há muito tempo, em outro lugar. Agora, você está aqui conosco, e tudo ficará bem.

Naquele momento, Ingrid viu seus pais entrarem na sala, também muito mais jovens e sorridentes do que quando ela os vira pela última vez. Ela jogou-se nos braços deles, chorando de alegria.

Eles sentaram-se à mesa na qual Tia Agnes já se encontrava sentada, servindo o vinho.

Ingrid olhava toda aquela cena da qual ela fazia parte, tendo certeza absoluta de que não podia ser verdade; era um lindo sonho do qual ela despertaria a qualquer momento. Com certeza, ainda encontrava-se caída naquele penhasco, desmaiada, e logo a terrível realidade que vivia iria novamente ao seu encontro.



Mas quando viu Jonas entrando pela sala, os cabelos molhados , cheirando à colônia após barba que sempre usava, ela levantou-se da mesa e correu até ele, caindo em seus braços. Ela podia sentir seu perfume, tocá-lo, ouvir seu riso, sentir seus braços fortes segurando-a. A textura da camiseta muito branca que ele vestia era real sob seus dedos. Seu peito junto ao dela, movia-se ao ritmo normal da respiração. No entanto, seus sentidos pareciam bem mais aguçados: via as cores mais vivas, sentia perfumes suaves que jamais sentira antes, e fisicamente, tinha a energia de uma saudável menina de dez anos de idade. 

Após um longo e apaixonado beijo, Jonas conduziu-a até a mesa onde se juntaram aos outros e desfrutaram do delicioso almoço servido por Tia Agnes.

***


Os três pescadores olharam para baixo, e avistaram um corpo de mulher caído sobre uma das plataformas do penhasco. Alarmados, desceram rapidamente a fim de socorrê-la; ao se aproximarem, viram o sangue que escorria sobre a pedra, tingindo a saia do vestido da moça. Chamaram-na; ela permaneceu imóvel.

Um deles tocou-lhe o pescoço, mas não sentiu qualquer sinal de pulsação. Ele olhou para os outros, e eles compreenderam, e tiraram seus chapéus em sinal de respeito. O pescador passou a mão pelo belo rosto da moça, fechando-lhe os olhos.

Um chapéu branco foi jogado ao mar pelo vento, e as ondas o recolheram.



2 comentários:

  1. ANA, QUE MARAVILHA, ADOREI, LINDO.
    TEU TALENTO É INEGÁVEL, ESCREVES COM MUITA PROPRIEDADE, PENA QUE AS PESSOAS NÃO LEEM QUANDO UM TEXTO É MAIS LONGO E POR ISSO PERDEM DE LER ALGO TÃO LINDO.
    QUANDO ESCREVERES O PRÓXIMO ME AVISA, QUE EU VIREI LER.
    ABRÇS
    http://zilanicelia.blogspot.com.br/

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  2. Bom dia Ana.. a Zilani falou algo bem notório nos dias de hj.. as pessoas fogem de uma leitura grande.. fogem até das simples poesias né rsrs mas para tudo tem publico.. eu posso dizer que adoro contos e aprendi a gostar ao ler os contos do edgar allan poe.. tens uma crianção particular e tudo bem detalhado como o conto tende a ser.. grato pela visita te desejo um lindo dia abração

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