segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

MALDADES - PARTE VII





Cheguei ao sítio de Sean. Tinha acabado de chover, e um arco-íris cruzava o céu. Achei a paisagem muito linda e muito triste. Parei o carro sob uma árvore. Eu precisava ser forte, ter coragem para fazer o que eu tinha ido fazer. Olhei para o pátio, e lembrei-me do dia em que tínhamos ficado noivos. Estávamos tão felizes! Se não fosse por Clara... estaríamos casados, vivendo juntos no sítio, talvez sentados à varanda olhando aquele arco-íris e fazendo planos para o futuro, planejando nossos filhos.

Entrei.

Lá dentro, tudo cheirava à adeus. O relógio cuco tiquetaqueava , e seu som enchia a casa vazia. Chamei por Sean, mas ele não respondeu. Ouvi passos arrastados; era Rita.

Ela pareceu muito surpresa em me ver. Arregalou os olhos e me olhou como se eu fosse um fantasma.

-Boa tarde, Rita. Onde está Sean?

-Boa tarde, dona Ana. A senhora por aqui? Ele viajou. Disse que não volta mais. Pensei que a senhora tinha ido com ele.

-Como assim, foi embora e não volta mais, Rita?

-Mas a senhora não sabia?! Meu Cristo!

-Foi embora para onde?

- Para o estrangeiro!

Ela se aproximou de mim, fazendo-me sentar no sofá.

-Sinto muito, dona Ana, muito mesmo. Vocês formavam um casal tão bonito! Mas “seu” Sean vendeu o sítio. Foi embora. Eu só estou aqui arrumando as minhas coisas, pois vou embora também. O novo dono chega amanhã. Eu vou ficar na casa de uma prima até arranjar outro trabalho. Quem sabe, o novo dono do sítio queira me contratar... nunca se sabe, não é? “Seu” Sean deixou uma carta de referências para mim. Se não conseguir o emprego de volta, eu...

Eu prestava atenção ao que ela me dizia sobre seus planos, tentando desligar-me da minha própria realidade. Minutos depois, Rita foi até a cozinha me preparar um café. Automaticamente, dirigi-me ao quarto de Sean. De repente, tudo era apenas uma brincadeira e ele estaria lá, sentado na cama, esperando por mim. Me abraçaria, começaríamos tudo novamente.

Mas a cama estava arrumada, impecável. Sobre a cômoda, um vidro de colônia esquecido. A colônia que eu lhe dera de presente de Natal. Peguei o vidro, abri e aspirei o perfume. As lágrimas finalmente desceram , tornando-se cascatas quentes sobre meu rosto.

Ele me dera a maior prova de desamor, indo embora sem nem mesmo despedir-se de mim, tratando-me como se eu fosse nada. Ele levara Clara com ele, em seu coração, e deixara tudo o que eu representava para trás, naquele vidro de perfume.

Derramei o conteúdo do frasco no chão. Virei as costas, saí do quarto. Passei por Rita , que segurava uma xícara de café, e saí da casa, sem nem mesmo olhar para trás.

Seis meses depois, recebi uma carta. Reconheci a caligrafia de Sean no envelope, e embora meu coração estivesse partido, eu simplesmente não pude abrir a carta. Eu sabia que ela provavelmente continha algumas desculpas que ele listara a fim de dar-me alguma satisfação. Talvez ele falasse de seu amor por Clara e do quanto ela lhe fazia falta.

Joguei a carta na gaveta da mesa de cabeceira, onde ela permaneceu por algumas semanas. As semanas tornaram-se meses, os meses tornaram-se anos.



Um comentário:

  1. Vim agradecer seu carinho,e pelas palavras que deixaste em meu blog.
    Obrigada Ana,amanhã volto para ler seu texto.
    Beijinhos.

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