segunda-feira, 11 de fevereiro de 2019

INOCÊNCIA - parte I- CAPITULO VII






MEU PAI

Meu pai era advogado, e chamava-se Nelson. Um nome simples para um homem de coração e hábitos simples. Era calado, e passava horas no escritório lendo jornal e estudando seus casos. Se era um homem bonito, não tenho muita certeza, mas minha tia Aurora de vez em quando comentava que ele era sim, um belo homem, ao contrário de seu marido, Tio Antônio, que ela dizia ter as pernas um pouco tortas. 

Meu pai era meu escudo, e existir sabendo que ele estava por perto me deixava sempre muito mais tranquila. Naqueles tempos, os pais tinham uma importância hierárquica muito diferente dos dias de hoje, e eram respeitados de uma maneira que os jovens de hoje não compreenderiam. Meu pai despertava respeito naturalmente, sem impor-se. E eu o amava loucamente!

Minhas melhores lembranças de infância são dos momentos que passamos juntos. Jamais me esquecerei da maneira como eu segurava seu polegar com meus dedos pequeninos de criança, enquanto passeávamos pela calçada de Rio da Prata e ele parava para cumprimentar conhecidos, que afagavam o topo da minha cabeça. Papai dizia: “Esta é a minha mais nova, Yara.” E o orgulho na voz dele me fazia inflar o peito. 

Muitas vezes ele foi severo comigo, e me disse coisas que me magoaram muito – talvez porque o amor que eu sentia por ele era tão profundo, que magoar-me era muito fácil. Passei algumas noites sem dormir pensando em como fazê-lo me amar de novo, após as broncas, sem nem imaginar que elas existiam justamente por causa do amor dele por mim. 

A insegurança que senti durante sua doença enchia minhas noites de fantasmas. Sofri muito, e amadureci precocemente por isso. O medo de perder meu pai era tão grande, que eu às vezes rezava e pedia a Deus que, se ele tivesse que ir embora, que me levasse junto. Secretamente, eu preferiria perder mamãe a perdê-lo, mas não confessava isso nem a mim mesma. Meu pai, mesmo doente, sempre foi a mão firme que me segurava nos meus momentos de fraqueza. E ele nem precisava dizer nada: bastava me olhar. Bastava puxar o lenço que sempre carregava no bolso e estendê-lo para mim quando eu chorava, passando a mão de leve sobre o topo da minha cabeça antes de ir embora. 




(CONTINUA...)

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