quinta-feira, 11 de abril de 2013

O Segredo de Gabi




O Segredo de Gabi


Gabi tinha apenas nove anos, e um segredo. É que, no terreno baldio próximo à sua casa, ainda havia as ruínas de um velho casarão. Ninguém sabia que nas tardes após a escola, enquanto dizia estar brincando no porão de casa com suas bonecas, Gabi escapulia pela cerca quebrada e ia visitar o casarão e seu terreno misterioso.

Mudara-se para a linda casa amarela na Rua das Hortênsias há apenas um mês e alguns dias, e ao explorar o território, achou o buraco na cerca. Curiosa e aventureira como a maioria das crianças, Gabi logo achou um jeitinho de passar para o outro lado sem que seus pais soubessem, com medo de que a proibissem. Assim que pisou no solo do terreno baldio, Gabi sentiu que ali tinha sido um lindo jardim; ainda havia roseiras entre o capinzal, e apesar da altura da grama, ainda cresciam flores do campo de várias cores. Caminhando mais para o fundo do terreno, ela deparou com o imponente casarão branco, cuja fachada, apesar das janelas em ruínas,demonstravam uma sublime austeridade.

Ao olhar para uma das janelas do segundo andar, Gabi pode ver o rosto de uma menina de tranças loiras, que olhava para ela, curiosa. Acenou para ela, e logo as duas estavam brincando juntas. Mas sempre que ouviam o carrilhão da sala de jantar bater quatro horas, Rose - a nova amiga de Gabi - pedia-lhe que ela fosse embora.

Gabi estranhava que jamais encontrara os pais de sua nova amiguinha, e quando perguntava por eles, Rose mudava de assunto: "Você quer fazer perguntas bobas ou brincar? Venha, vou lhe mostrar minha casa de bonecas." Ou então algum brinquedo fascinante que logo fazia com que Gabi esquecesse da sua curiosidade.

Andar pelo casarão enorme e semi-obscurecido era assustador, mas Gabi não tinha medo de nada quando estava com Rose. Elas caminhavam pelos muitos corredores de paredes descascadas, entravam e saíam dos muitos quartos cujo assoalho rangia, brincavam de esconde-esconde no grande salão, e se escondiam atrás dos velhos sofás mofados e empoeirados. Um dia, Rose levou-a até um quarto menor, nos fundos da casa, onde havia um cavalinho de balanço cor-de-rosa. A tarde entrava pela janela, trazendo uma luz diáfana ao cenário, e chamando a atenção da menina para um lindo cristal pendurado à janela, que cintilava com aluz do sol, formando pequenos arco-íris nas paredes. Rose jogou-se sobre a cama de lençóis estampados de flores miúdas, dizendo: 

-Aqui era o meu quarto.
-Era? Não é mais?
-Não... 
-E onde é seu quarto hoje, Rose?
-Um dia eu levo você lá... mas hoje não dá. Olha, já são quase quatro horas, e você tem que ir.

Um dia, as duas estavam deitadas sob a sombra de um enorme carvalho, e Gabi mastigava uma haste de capim enquanto brincava de pegar com os raios de sol que se infiltravam entre as folhas das árvores, fechando os olhos antes que o vento os fizessem brilhar e abrindo-os quando as folhas voltavam a encobri-lo. Em certo momento, ao olhar para o lado, Rose havia desaparecido. Mas como, se não a tinha visto sair? Achando que era uma brincadeira de esconde-esconde, Gabi levantou-se e começou a chamar pela amiga em voz alta: "Rose! Rose! Aonde está você?" Procurou pelo enorme e silencioso casarão, tentando vencer seu medo. Se Rose queria pregar-lhe uma peça, não daria a ela esse gostinho! 

Subiu as escadas para o segundo andar, pisando com cuidado nas tábuas dos degraus, para que os mesmos não rangessem e denunciassem sua presença. Ao chegar no topo, olhou o corredor muito longo à sua frente, as paredes nuas que soltavam cascas de tinta, e escutou o barulho do vento que assoviava entre as gretas. Sentiu um arrepio de medo, mas engolindo em seco, avançou pelo corredor, checando cada cômodo, até que chegou no antigo quarto de Rose. Entrou.

Naquele momento, ouviu o carrilhão da sala de jantar começar a bater quatro horas. Transida de susto, voltou-se para a porta, mas esta, movida por um vento forte súbito, bateu e trancou-se. Por mais que Gabi, desesperada, tentasse abri-la, não conseguiu. Bateu e socou, gritando por ajuda, mas como resposta, teve somente o sussurro do vento e o pio de uma pomba-rola que pousou na árvore junto à janela.

A noite caiu, banhada em silêncio.



..........................................................................

Era uma linda manhã de sol, e Priscila, a nova moradora da casa amarela da Rua das Hortênsias, estava muito feliz. Aos doze anos de idade, era uma mocinha alegre e curiosa, como quase todas as mocinhas são, aos doze anos.

Começou a explorar sua nova residência de manhã bem cedinho, enquanto os pais ainda dormiam, quando achou um buraco na cerca entre sua casa e o terreno baldio vizinho. Ao cruzar a cerca, deparou com uma linda menina de cabelos cacheados que lhe sorria, estendendo-lhe a mão. Ela perguntou, enquanto se aproximava:

-Olá! Meu nome é Priscila, e acabo de mudar para cá. Como é seu nome?

A menininha sorriu-lhe novamente, um sorriso encantador, que conquistaria a amizade eterna de qualquer menina, respondendo:

-Meu nome é Gabi.




4 comentários:

  1. Aaaaaaaiii MEDO!

    Ana, adoro esses teus contos pá-pum com essa atmosfera de suspense e pitadas de terror veladas. Tudo na medida certa.

    Coitada da Priscila... Se ela não sair da casa antes das 4 horas, bye bye!
    Muito bom!!

    Manda mais!

    ResponderExcluir
  2. ANAAAAA.
    O QUE É ISSO QUE VOCÊ FAZ COM A GENTE ME DIZ?

    COMO PODE?

    ESTOU PETRIFICADA, ME LRMBROU O FILME OS OUTROS QUE OS FANTASMAS ACREDITAVAM O TEMPO TODO SER OS HUMANOS E ACHAVA QUE OS HUMANOS ERAM OS FANTASMAS. QUE COISA. ADOROOOOOOOO, SUAS HISTÓRIAS ME DEIXAM INCRIVELMENTE FELIZ. PELO SIMPLES FATO DE AMAR ISSO, E NUNCA TINHA NINGUÉM PARA COMPARTILHAR, A NÃO SER NOSSA AMIGA LÚ QUE ELA AMA TAMBÉM, SEMPRE FUI MTO SOZINHA NISTO, ENTRE AMIGAS, FAMILIA, IRMÃS, TODO MUNDO TEM MEDO, E ME ACHA DOIDA, AGORA TENHO VOCÊ, É MTO BOM.

    BJS NO TEU CORE.

    PATTY.

    ResponderExcluir
  3. Ana, seus contos são muito bons! Coloca mistério e o inexplicável para o mundo real. Bjs.

    ResponderExcluir

Obrigada por visitar-me. Adoraria saber sua opinião. Por favor, deixe seu comentário.

A RUA DOS AUSENTES - PARTE 5

  PARTE 5 – AS SERVIÇAIS   Um lençol de luz branca agitando-se na frente do rosto dela: esta foi a impressão que Eduína teve ao desperta...