quarta-feira, 6 de novembro de 2013

EVA - Capítulo II





EVA – Capítulo II



Mamãe andava muito ocupada com seu trabalho. Estava organizando sua quarta exposição (ela era artista plástica) mas desdobrava-se para fazer com que Eva ficasse à vontade. Sempre almoçava em casa, embora algumas vezes precisasse jantar fora, ocasiões em que papai a acompanhava, e eu ficava em casa, encarregado da feliz tarefa de paparicar Eva.

Já havia uma semana que ela estava hospedada conosco, e minha paixão por ela só fazia crescer cada vez mais... pensava nela o tempo todo. Adorava o ar que ela respirava, e ficava embevecido pelo perfume que ficava nos cômodos por onde ela passava. Reparava em cada roupa que ela usava, admirando seu bom gosto, elegância e simplicidade; roupas que talvez parecessem apagadas em outras mulheres, assentavam-lhe com perfeição, e ressaltavam a beleza de suas formas e as cores de sua pele e cabelos. Logo eu, que jamais reparava nessas coisas, passei a prestar atenção a ela, comparando-a com as garotas da faculdade e com outras mulheres que conhecia (a maioria, amigas de mamãe) e percebia o quanto a maioria delas adornava-se exageradamente, usando maquiagem às vezes pesada e roupas enfeitadas demais. Mas Eva era a elegância em pessoa! Das joias usadas como peças únicas à maquiagem quase imperceptível, que não escondia as marcas da passagem do tempo, aos vestidos simples e esvoaçantes, às calças jeans e camisetas despojadas, adornadas por lenços coloridos ou longos colares, aos chapéus cor de creme e óculos escuros sóbrios e tradicionais (aparentemente, muito caros e antigos) que ela costumava usar quando o sol estava muito forte.

Ela adorava ser mimada por mim, e muitas vezes, andávamos na rua de mãos dadas parando nas barracas de frutas da feira, onde ela escolhia uma maçã ou pêssego, dando-lhes uma generosa mordida e passando-os para mim, enquanto conversava com o feirante e negociava preços, enchendo sacolas plásticas com as frutas perfumadas. Quando chegávamos em casa, Eva arrumava as frutas artisticamente sobre a mesa de jantar, entremeando-as com flores do campo, o que deixava mamãe encantada e agradecida. Depois, Eva dizia sorridente à minha mãe o quanto eu era gentil, bem educado e atencioso.

Às vezes, ela me levava com ela para ver apartamentos. Eu sempre colocava algum defeito em todos eles, pois não queria que ela fosse embora. Eva sempre concordava comigo, franzindo sua linda testa e dizendo: “Você tem razão... veremos outro amanhã.” Aquilo me fazia pensar que ela também não estava muito à vontade com a ideia de mudar-se. Um dia, ela me confessou que ficar sozinha em um apartamento seria uma experiência inédita para ela, e que estava com medo. Caminhávamos por uma rua movimentada, e o dia estava quente e alegre. Quando ela disse aquilo, levou a mão ao rosto, e vi quando ela secou uma lágrima que caía. Outras lágrimas seguiram-se àquela, e Eva parou em frente a uma vitrine, fingindo que observava alguma coisa para não ter que deixar-me vê-la chorando.

Meu coração derreteu-se; segurei-lhe a mão, que ela apertou com força, e vi seu nariz ficando cada vez mais vermelho, e as lágrimas jorrando. Não pude deixar de abraçá-la, deitando sua cabeça em meu ombro. Ela não resistiu, e passou um braço em volta de minha cintura. Ficamos ali, em breves momentos que para mim pareceram horas, e que eu jamais desejaria que acabassem. Tinha o perfume de seus cabelos sob as minhas narinas ansiosas, e o calor do seu corpo contra o meu. Sentia-lhe a respiração em meu pescoço e as pontas dos seus dedos tocando de leve a minha cintura. Foi um momento doce e intenso.

Quando finalmente ela se separou de mim, pegando um lenço na bolsa, sussurrou-me um “Obrigada... desculpe-me...” e eu só pude olhá-la, totalmente emudecido pela força daquele momento. 

Meus amigos da faculdade me telefonavam, convidando-me para noitadas – o que eu sempre estava disposto a aceitar e gostar no passado, mas não mais. Certa manhã, enquanto eu me vestia, meu pai adentrou meu quarto e sentou-se em minha cama, jogando-me uma almofada de brincadeira:

-E aí, campeão? Como estão as coisas?

-Tudo bem, pai.

-Você não tem saído muito, Elton. Está tudo bem mesmo com você?...Quero dizer... antes eu e sua mãe tínhamos que implorar para que você ficasse uma noite em casa, e agora você não sai mais! Graça está preocupada e pediu-me para conversar com você.

-Tentei soar o mais natural possível:

-Fique tranquilo, pai. Eu estou ótimo. Só um pouco cansado... a faculdade foi ‘barra’ no segundo semestre!

-Mas antes você não ligava para isso. Não antes de Eva mudar-se para nossa casa...

Senti que meu coração ia sair pela boca. Respirei fundo e tentei um sorriso:

-Ora, senhor Antônio, reparando nas hóspedes da mamãe? Olha que elas são amigas de infância! (peguei a almofada no chão e joguei-a de volta sobre ele).

-Ela é bonita, não é? – ele perguntou-me maliciosamente.

Notei que ele me olhava como se estivesse tentando ler a minha mente. Meu pai já sabia de minha paixão! Mas eu precisava negá-la até o fim. Ele levantou-se de minha cama, e parando em frente a mim, segurou-me pelos ombros, obrigando-me a encará-lo:

-Você sabia que ela tem quarenta e seis anos, filho? E uma filha da sua idade?

-Ora, pai... ela me disse! (tentei desvencilhar-me, mas ele me segurou com força):

-Pois é... isso faz com que ela seja exatamente vinte e cinco anos mais velha que você. Já pensou? Quando você tiver... digamos... trinta, ela terá... cinquenta e cinco!

-Eu não sei do que você está falando, pai. Aonde você quer chegar?

Ele soltou meus ombros, me obrigando a sentar-me na cama ao lado dele:



- Elton, sua mãe não percebeu ainda, pois ela tem estado realmente muito ocupada com a exposição e absolutamente encantada com a sua disponibilidade em deixar a amiga dela à vontade; mas eu tenho notado que você mudou desde que Eva entrou nessa casa. E que vocês tem passado tempo demais juntos. 

Eu não respondi. Abri a boca, mas as palavras não saíam.

-Eu sei que uma mulher bonita como Eva, madura e experiente, pode ser muito atraente para um garoto novo como você; mas não faz sentido, filho. Ela poderia ser sua mãe! 

-Ah, pai... eu... apenas gosto da companhia dela! Ela é diferente daquelas amigas pedantes da mamãe. E a gente pode conversar com ela, o que não acontece com as meninas da faculdade, que só pensam em... roupas, e... maquiagem, e só falam de festas, garotos... e mal umas das outras.

-Pois é, Elton. Mas eu acho melhor você se aproximar mais das meninas fúteis da faculdade, pois elas tem a mesma idade que você. Você está na idade de ser fútil, divertido, e conversar amenidades, e não de ficar enfurnado em casa, ou andando por aí na companhia de uma mulher como Eva. Não faz sentido. Pense bem: o que as outras pessoas vão pensar?

-Que se danem, pai.

Levantei-me, e peguei meu boné, ajeitando-o na cabeça. Ele não perdeu tempo:

-Você fica muito bem com esse boné, filho. Ele mostra bem a sua idade.

Tirei o boné, guardando-o de novo no armário e alisando os cabelos. Meu pai ficou de pé atrás de mim, olhando-me pelo espelho:

-Apenas prometa-me que não vai se apaixonar por ela, filho. Seria ridículo! E que vai aceitar alguns dos convites dos seus amigos para sair. 

Assenti com a cabeça, e escorreguei para fora do quarto.

Eva me esperava na sala de jantar; marcáramos com um corretor na cidade. 

O apartamento ficava no nono andar, em frente a um lindo parque. Tinha dois quartos pequenos, sendo uma suíte, uma enorme e ensolarada sala com dois ambientes, uma cozinha moderna e um banheiro recém reformado, com direito à hidromassagem. Mas o mais encantador, era a varanda envidraçada, que circundava todo o apartamento, transformando-o em uma caixa de luz. Fiquei procurando vazamentos e defeitos, enquanto Eva percorria os cômodos com seus saltos barulhentos. Tentei ver um pedaço de tinta descascando, ou uma torneira ou descarga que não funcionassem. Sabia que ela adorava casas iluminadas e grandes janelas, o que me deixou apreensivo. Minha apreensão aumentou ainda mais quando ela sorriu para o corretor, e os dois começaram a conversar sobre preços, o que nunca acontecera antes ( ela sempre despedia-se deles dizendo que ia pensar melhor).

Fiquei absolutamente transtornado quando ela caminhou até mim, vestida com seu mais lindo sorriso, e disse:

-É este!!!

Vi seu sorriso se desmanchar diante da minha cara decepcionada. Engoli em seco, e forjei um sorriso. Ela franziu as sobrancelhas:

-Você não gostou? É perfeito! E eu posso pagar.

-É alto demais... pense bem; e se o elevador quebrar? Se a luz acabar, ou algo assim, você terá que subir ou descer nove andares!

O corretor interferiu:

-O prédio dispõe de um potente gerador para estas ocasiões, senhora. Não se preocupe.

Ela pediu ao corretor se poderíamos ficar mais alguns minutos, a sós. Ele sorriu, entregando-lhe as chaves, e dizendo:

-A senhora e seu filho podem ficar à vontade! Quando terminarem, basta me dar um telefonema; estarei na corretora. Um bom dia!



4 comentários:

  1. Gostei deste blog, agora estarei sempre por aqui....boa anoite Ana Bailune...um grande abraço..

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  2. Olá!Boa tarde,Ana!
    cheguei até o capítulo dois...
    Muito bela continuação...
    é, apaixonou mesmo por Eva, uma mulher mais velha...e o que o pai temia , o corretor através de uma "gafe" deixou a descoberto,"sua mãe"...depois, leio o terceiro!
    Bom final de semana
    Beijos

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  3. Muito bom querida, o coração humano com suas honestidades e desonestidade emocionais são bem descritos neste capítulo. Continuarei a ler o restante desta novela literária.

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