quarta-feira, 13 de fevereiro de 2019

INOCÊNCIA - Parte I - Capítulo VIII









SOBRE MAMÃE

É claro que eu amava minha mãe! Ao contrário de sua irmã, Tia Aurora, minha mãe era uma pessoa calada e sem afetações. Alta, magra e elegante, vestia-se com simplicidade e esmero, mas não se preocupava com aparências. Costumava prender os cabelos em um rabo de cavalo ou em um coque, e raramente aparecia com eles soltos. Mas apesar de amá-la muito, eu era bem mais próxima de meu pai. 

Porque mamãe sofria de depressão, uma doença que naquela época era ignorada, considerada muitas vezes como “fricote de madame.” A doença a afastava de nós por longos períodos, nos quais ela se trancava no quarto e não falava com ninguém, e perdia a paciência facilmente. Naqueles períodos, ninguém ousava aproximar-se dela. Papai principalmente. 

Eu hoje vejo o casamento deles como uma relação que era cheia de silêncios e hiatos. Algo formal, quase forçado. Eles se davam muito bem, andavam de mãos dadas pela rua, recebiam os convidados com graça e simpatia, eram respeitosos um com o outro e pareciam apreciar a companhia um do outro, mas havia uma camada de gelo entre eles, algum mistério, que hoje eu sei o que é, mas que naquela época me deixava intrigada. 

Minha mãe era como um quadro na parede que eu passava horas apreciando, alguém cujos trejeitos eu às vezes tentava copiar. Eu a admirava. Durante um tempo, eu a odiei, e até mesmo desprezei. Na verdade, eu não a compreendia, como acontecia com a maioria das pessoas (exceto tio Duílio, sócio de papai, com quem ela parecia se abrir). Eles passavam horas conversando, e quando ele ia embora, mamãe parecia melhorar muito, e nossas vidas voltavam ao normal. Por isso, para mim as visitas dele eram sempre bem-vindas. 

Mamãe foi uma verdadeira leoa em ocasião da doença de meu pai, sempre ao lado dele, sempre tentando superar os próprios problemas a fim de cuidar dele. Passava dias a fio no hospital sem admitir que alguém a substituísse. Depois, caía em um longo período de letargia e sono. Acredito que estivesse sob o efeito de medicamentos. 

Pena que nossos últimos anos foram tão distantes... eu gostaria de poder fazer o tempo voltar a fim de acertar minhas diferenças com ela. Mas a gente sempre pensa que as pessoas estarão ali para nós a vida toda. 

(continua...)



3 comentários:

  1. Ólá, Escritora/Poetisa, Ana Bailune !
    Conheci e conheço muitas pessoas, assim, como foi
    a mãe que descreves.
    Sofrem e fazem sofrer as pessoas que lhe estão próximas.
    O melhor remédio ainda é a compreensão.
    Bela história humana, Amiga.
    Parabéns e um afetuoso abraço.
    Sinval.

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  2. Uma história escrita por um coração cheio de amor!! AMEI!

    Queria sentir-me a deusa dos sonhos.
    Beijo, e bom bom fim de tarde!

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