terça-feira, 11 de junho de 2013

ACEITAÇÃO - PARTE VII - FINAL





ACEITAÇÃO - PARTE VII - FINAL


Assim que arejei e arrumei o quarto de hóspedes para que as duas ficassem bem confortáveis, colocando uma caminha extra para Verônica, a campainha tocou. As duas estavam sentadas no sofá, conversando baixinho. Atendi a porta; eram minhas amigas, Zilá e Gertrudes. Fiz as apresentações, e percebi que elas se entrosaram imediatamente. Minhas amigas eram sempre pessoas muito simpáticas e acolhedoras, o que contribuiu para que Rosane e Verônica ficassem mais à vontade. Sentei-me me minha poltrona preferida, enquanto Zilá e Gertrudes, de pernas cruzadas sobre o tapete, faziam de tudo para que as duas hóspedes ficassem bem à vontade. Eu disse:

-Bem, Espero que vocês fiquem bem aqui. 

Rosane me olhou, e novamente, vi gratidão no rosto dela:

-Muito obrigada. Eu não sei se mereço o que você está fazendo por mim, mas quando você for assaltada por esta mesma dúvida, e tiver certeza de que eu não mereço, saberá que pelo menos minha filha merece!

Eu baixei os olhos, respirando fundo. Dirigindo-me à Verônica, comentei:

-Bem, Verônica... você também tem uma avó. Gostaria de conhecê-la?
Verônica arregalou os olhos:

-Mas é claro que sim! Adoraria!

Ela e a mãe se entreolharam. Minhas amigas nos observavam, contentes.

-Bem, Verônica - continuei - mas antes eu terei que saber se sua avó deseja conhecê-la. Não posso garantir... ela é uma pessoa muito difícil, devo dizer.

O sorriso dela arrefeceu um pouco, mas ela disse animadamente:

-Ah... eu posso convencê-la. Que mulher não gostaria de ter uma neta como eu?

Todos rimos.

Os dias que se seguiram foram suaves e muito intensos, ao mesmo tempo. Logo, fiquei muito amiga de Rosane, e vi que nós duas tínhamos muito em comum. Ela apenas era bem mais corajosa do que eu! Falou-me de suas viagens (que eu sempre sonhei em fazer, mas nunca tive a coragem de investir tempo e dinheiro nelas) e das muitas pessoas famosas com quem teve contato. Lamentou que agora que estava doente, nenhum deles a contatara. Achou que tinha construído uma vida afetiva um tanto fraca. Fiquei sabendo de sua orfandade, aos vinte anos, quando os pais sofreram um acidente de carro. Ela não tinha irmãos, nem parentes vivos. Fez a vida como soube e como pode, e mesmo assim, viveu intensamente. Passei a admirá-la, e senti que meus conceitos mudavam pouco a pouco conforme eu a conhecia melhor. Tornei-me uma pessoa mais relaxada, menos ansiosa. 

Um enfermeiro vinha cuidar dela uma vez por dia; ajudava-a com o banho, nos dias em que ela sentia-se fraca e não conseguia fazê-lo sozinha; enquanto isso, Verônica tinha mais tempo e tranquilidade para estudar e frequentar a faculdade, cujos pagamentos eu assumi. Assumi também as despesas com remédios, alimentação e roupas. Enfim, compreendi que dava a elas apenas o que elas tinham por direito! 

Contratei um advogado, que cuidaria para que Verônica recebesse sua parte na herança do pai. Mas ela disse que preferiria continuar vivendo comigo, se eu concordasse. É claro, surpreendendo a mim mesma, percebi que era tudo o que eu mais queria; imaginar minha vida sem ela estava ficando cada vez mais difícil. Eu realmente aprendera a amá-la como a uma filha, e em tão pouco tempo de convivência!

Minha sogra ficou extremamente feliz ao saber que tinha uma neta, e as duas tornaram-se amigas inseparáveis. Ela também gostou muito de Rosane, e um belo dia, após uma visita, quando fui conduzi-la até a porta, ela de repente abraçou-me dizendo:

-Fui muito injusta com você, Débora, e espero que um dia você me perdoe.

Daquele dia em diante, passamos a ser amigas de verdade, pela primeira vez. Ela também conheceu melhor minhas amigas, e passou a aceitá-las. 

Numa tarde de sábado, em que Rosane sentia-se muito bem, fomos todos ao parque da cidade. Passamos um dia maravilhoso, ao sol de inverno, fazendo pic-nic, jogando bola, tirando fotografias (muitas!) ou sentadas na grama conversando: seis mulheres, de diferentes estilos de vida, totalmente relaxadas e à vontade na presença umas das outras. Conversas muito profundas aconteceram, e percebemos que afinal de contas, éramos todas bem parecidas, pois tudo o que fizéramos, mesmo os erros que cometêramos, eram apenas tentativas de encontrar a felicidade.

Ao chegarmos em casa, Rosane e eu ainda ficamos conversando junto à lareira durante um bom tempo, depois que Verônica foi dormir e as outras se foram. Lembramos fatos da infância, e senti que ela estava partilhando comigo memórias que jamais partilhara com ninguém. Quando fomos nos deitar, vi que seu semblante estava tranquilo, e mais belo do que eu jamais vira. Antes de deitar-se, ela me abraçou sorrindo, e agradeceu-me mais uma vez.  Ela foi até o quarto de Verônica, e sentando-se na beirada da cama, acariciou-lhe os cabelos. A mocinha despertou, enlaçando-lhe o pescoço. Ouvi o seguinte diálogo:

-Mãe, eu te amo. 
-Eu também, Verônica. Muito!
-Sabe... hoje você está tão bem, que acho que Deus vai nos dar mais uma chance!

Rosane sorriu, respondendo:

-Ele já nos deu, querida. Boa noite.
-Boa noite, mãe.

Rosane se foi na manhã seguinte. Ao abrir as janelas do quarto para servir-lhe o café da manhã, vi que ela tinha ido embora. Seu rosto estava tranquilo, e senti que ela tinha ido em paz. 

 Verônica aceitou tudo com muita maturidade e resignação. Os anos passaram, e enquanto eu assistia à cerimônia de formatura de Verônica, estas memórias afloraram com muita força. Por isso, decidi escrever sobre elas.


4 comentários:

  1. Oi Ana!Uma história de vida onde o destino prega peças que nem imaginamos!Bonito final,apesar de triste e um conto muito bem articulado e interessante de ler!bjs,

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  2. Muito bem escrito, Ana, parabéns! bjo

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  3. Bem interessante esta história de vida que aqui nos passou.Vemos que há pessoas boas que se encontraram porque assim o destino quis.Bj.

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  4. Oi Ana, parabéns pela linda história que acabou e contar, ficamos com vontade sim de ler todas as partes que você escreveu muito bem.Uma história real, que nos deixa uma grande lição. As vezes da vontade de chorar outras não, mas é a vida, cheia de altos e baixos, encontros e desencontros traçados pelo destino, para quem acredita, ou por Deus que escreve certo por linhas tortas. Abraçoss

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